Matéria publicada pelo Diário do Grande ABC, em 2/1/2019, que contem entrevista do Coordenador do Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da USCS.
2/01/2019 às 07:26
Salário mínimo vai a R$ 998 neste ano
Soraia Abreu Pedrozo
Do Diário do Grande ABC
Do Diário do Grande ABC
Recém-empossado como presidente da
República, Jair Bolsonaro (PSL) assinou decreto, na noite de ontem, com o valor
do salário mínimo vigente para 2019: R$ 998. Tradicionalmente, o ato ocorria
nos últimos dias do ano, porém, o ex-presidente Michel Temer (MDB) deixou a
missão para seu sucessor.
Após dois anos com reajuste abaixo da inflação, o piso do mercado de
trabalho volta a receber aumento real. A correção de 4,61% no valor do salário
mínimo – de R$ 954 para R$ 998, ganho de R$ 44 – supera a estimativa do INPC
(Índice Nacional de Preços ao Consumidor) realizada pelo Banco Central, de
3,5%. O percentual exato da inflação de 2018 será divulgada apenas no dia 11.
LEIA MAIS
Apesar do aumento, a expectativa era a de que o piso fosse a R$ 1.006, e
pela primeira vez na história ultrapassasse a casa dos R$ 1.000. O montante
havia sido aprovado pelo Congresso Nacional no dia 19 de dezembro, como parte
do Orçamento da União para 2019. Dessa forma, o reajuste seria de 5,45% ou R$
52.
No Orçamento, o governo havia projetado elevação de 4,20% na inflação,
mas a variação acumulada em 12 meses até novembro está em 3,56%. Além disso,
será adicionado valor residual de R$ 1,75, porque o INPC em 2017 ficou acima do
que foi considerado na definição do mínimo de 2018. No ano passado, a correção
de 1,81% (R$ 17), o menor percentual de correção em 24 anos, ou seja, desde o
início do Plano Real.
A fórmula que atualiza o salário mínimo é composta pelo PIB (Produto
Interno Bruto) de dois anos atrás mais a inflação medida pelo INPC. Em 2016,
porém, a geração de riquezas apresentou queda de 3,6%, a pior recessão da
história. Conforme a regra, quando isso ocorre, o PIB é desconsiderado do
cálculo. Neste ano, foi somado o crescimento da economia em 2017, de 1%, com a
expectativa da inflação.
IMPACTO - Na avaliação do economista e coordenador do Conjuscs
(Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura) da USCS
(Universidade Municipal de São Caetano), Jefferson José da Conceição, embora
tenha sido concedido aumento acima da inflação, o fato de Bolsonaro não ter
aprovado os R$ 1.006 mostra, já no primeiro dia de mandato, a tônica dos
próximos quatro anos de governo: reduzir cada vez mais a intervenção do Estado
na Economia. E, dentro desta lógica de reduzir despesas e investimentos
públicos, a política de valorização do salário mínimo vai deixando de existir.
“Com isso, o piso do mercado de trabalho vai deixando de ser referência aos
valores pagos por serviços prestados, e quem irá valorizar ou não o salário
será o mercado, pagando o quanto ele acha que vale o trabalho realizado”,
avalia. “Ao estabelecermos um valor mínimo menor do que o esperado, temos menor
quantidade de dinheiro circulando na economia, o que reduz suas chances de
expansão. Esta é a âncora do crescimento.”
Para ele, embora a projeção do PIB deste ano seja de alta de 2,5%, ele
não acredita que passe de 1,5%.
O impacto dos R$ 8 que deixam de ser pagos, segundo Conceição, é o achatamento,
em vez da valorização, dos vencimentos de categorias que têm como referência o
salário mínimo, a exemplo de agricultura, comércio, vigilância e limpeza, entre
outros.
Ao menos R$ 2,8 bi deixam de girar na economia
Hoje no Brasil, 27 milhões de aposentados e pensionistas recebem o
equivalente a um salário mínimo. Conforme cálculos do coordenador do Conjuscs,
Jefferson José da Conceição, com a decisão do governo de fixar em R$ 998 o piso
do mercado de trabalho, em vez dos R$ 1.006 aprovados pelo Congresso, pelo
menos R$ 2,8 bilhões deixarão de circular na economia neste ano.
O governo, por sua vez, projeta que cada R$ 1 de aumento no salário
mínimo gera incremento de cerca de R$ 300 milhões ao ano nas despesas da União.
Ou seja, com o aumento de R$ 44, o impacto neste ano será de cerca de R$
13,2 bilhões. Caso o montante maior tivesse sido aprovado, a diferença de R$ 55
elevaria o desembolso adicional para R$ 15,6 bilhões, uma diferença de R$ 2,4
bilhões.
“Esse já é um dos indícios do teor da reforma da Previdência, em que o
objetivo é cortar gastos a todo custo”, assinala Conceição.
Ele pondera, ainda, que o montante está muito aquém do necessário para
se viver com dignidade. “Com o mínimo acima de R$ 1.000 diminuiríamos um pouco
a distância entre a realidade do mercado de trabalho e dos benefícios
previdenciários. De acordo com o Dieese (Departamento Intersindical de
Estatística e Estudos Socioeconômicos), para manter uma casa com dois adultos e
duas crianças, conforme valores de novembro, seriam necessários R$ 3.959, mais
de quatro vezes acima do piso”, exemplifica.
INTERMITENTE - O economista também alerta para o fato de que Bolsonaro
já deixou claro que é favorável à maior informalidade do mercado de trabalho.
Com isso, a tendência é que cresçam contratos de emprego intermitente,
regulamentado pela reforma trabalhista, nos quais o empregado é contratado para
atuar apenas mediante convocação ou demanda e recebe uma remuneração conforme o
período pelo qual trabalhou.
Tanto que, no decreto assinado ontem, estão previstos os valores mínimos
de R$ 33,27 para a diária de trabalho e de R$ 4,54 para a hora. “A tendência é
que, com a popularização desta modalidade, os profissionais recebam até menos
do que um salário mínimo”, sentencia.
Nenhum comentário:
Postar um comentário