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segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

O CAPITAL NÃO É GELEIA


Jefferson José da Conceição (jeffdacsenior@gmail.com)

As ideias liberais têm sido apresentadas pelas atuais autoridades econômicas brasileiras como antídoto para os supostos males gerados pelas políticas econômicas e sociais “excessivamente regulamentadoras do mercado”. Na lógica do atual Governo, as políticas econômicas e sociais das gestões anteriores não teriam sido “market friendly”. Neste discurso, o Governo conta com o apoio de outras instancias de poder: Partidos, Congresso, STF, entre outras.

Este  ambiente interno pró "mercado" é o que orienta as Reformas da Previdência e Trabalhista, a aprovação da PEC que limita os gastos públicos por 20 anos, a flexibilização na produção e exploração do petróleo, entre outras iniciativas do Governo.

Nesta toada, as autoridades e a intelectualidade de formação liberal costumam acusar os intelectuais contrários ao liberalismo de atrasados e de realizar políticas distorcidas e ineficazes. Muitas vezes, os liberais referem-se aos EUA como exemplo a ser seguido para atingirmos nosso desenvolvimento.

Por tudo isto, estou a procura de comentários de representantes do liberalismo brasileiro sobre as ações do Presidente Donald Trump, recém-empossado. No primeiro mês de seu governo, Trump deu ordens para construir o muro na fronteira com o México (retomando a prática dos feudos) ; retirou os EUA do bloco do Transpacífico (que visava incrementar o comércio em um grande número de países que compõe o acordo); decretou controle de migração de refugiados e cidadãos de países de maioria muçulmana (o que significa impor barreira ao livre fluxo da força de trabalho).

Os depoimentos de Trump no último dia 17/2/2017 devem ter sido ainda mais intragáveis para os nossos liberais de plantão. Em evento na Carolina do Sul, Trump disse: “as empresas que demitirem americanos e levem suas operações para o exterior terão uma punição substancial (...). Brigarei por cada um dos empregos americanos”.

Mais: ainda na campanha eleitoral, Trump declarou que sobretaxaria produtos feitos no exterior em nações que tivessem custos de produção menores e, desde esses países, exportassem estes produtos para os EUA. De acordo com a imprensa, empresas como GM, Ford, e Walmart entenderam o recado e retraíram projetos na Ásia e na América Latina. Estes projetos, ao que parecem, serão agora realizados em fabricas americanas.

Evidentemente, não me alinho entre aqueles que admiram Donald Trump. Ao contrário, creio que os EUA e o “resto do mundo”, com Trump, viverão uma instabilidade política e econômica acentuada. O cenário internacional tornou-se muito complexo.

Entretanto, meu objetivo aqui ao citar Trump foi apenas o de mostrar as contradições do discurso liberal. Os EUA definitivamente não seguem hoje uma política de liberdade econômica internamente às suas fronteiras e tampouco nas suas relações internacionais.

Outro depoimento digno de registro na semana foi o do ex-economista-chefe do Fundo Monetário Internacional - FMI, Olivier Blanchard, em entrevista à Folha de São Paulo, publicada em 19/2/2017. Certamente ninguém acusará o FMI de instituição vinculada a marxistas, esquerdistas ou mesmo desenvolvimentistas. Isto torna ainda mais emblemáticas as afirmações. Na entrevista, Blanchard, que liderou o FMI entre 2008-2015, admite"um possível acordo para a taxação de fluxos de capitais em situações emergenciais" e sustenta que cabe regulação flexível do setor bancário, "com regras mais rígidas em períodos de expansão e menos estritas nos momentos de desaceleração";

Diante do que dizem personalidades como Trump e Blanchard, e comparando com o que vivem repetindo os nossos liberais de plantão, podemos concluir que os liberais brasileiros querem ser mais realistas que o rei. 

A necessidade de regulamentar o fluxo de capital

Os depoimentos de Trump também me fizeram retomar neste artigo considerações que eu já havia levantado, aqui no blog, em junho do ano passado a respeito do nosso questionamento ao pressuposto de que o capital tem e deve ter total flexibilidade. Discordamos da plena flexibilidade ao capital, às empresas.

A nosso ver, em uma sociedade civilizada, o capital - seja ele produtivo ou financeiro -  deve ser estimulado sim a acumular lucros, investir e crescer (e desta forma gerar inovações, desenvolvimento, renda e empregos); mas deve também cumprir exigências impostas pela sociedade, como parte do pacto social que visa evitar a barbárie (o desemprego, o vazio nas cidades; a quebra de relações com fornecedores, agências de desenvolvimento local, universidades, entre outras instituições).

Incluo-me entre aqueles que acreditam que, mesmo em uma economia capitalista, a sociedade deve instituir padrões civilizatórios mínimos. Isto significa que a propriedade e as decisões empresariais devem também cumprir uma função social. Aliás, é isto que, no Brasil, prega a Constituição Federal em seu artigo 170 em seu inciso 3.

Nos parágrafos a seguir retomamos nossas propostas de regulamentação dos casos em que ocorrem fechamento de plantas das empresas.

Nossas propostas de regulamentação em situações de fechamento de plantas das empresas

As propostas aqui apresentadas visam regulamentar as decisões de ir e vir das empresas em relação às suas plantas produtivas, maquinários e pessoas, de uma localidade para outra, por meio de fechamento de fábricas (plantas, unidades produtivas) e sua transferência para outra localidade. O capital não é uma geléia que pode ir livremente de lá para cá, como um processo natural em busca de um suposto “equilíbrio” sem traumas.

Nossas propostas chocam-se, é claro, com o pressuposto de que a decisão da desinstalação e transferência de uma unidade produtiva é de responsabilidade exclusiva da empresa. Na visão liberal, nesta decisão não cabe a obrigatoriedade da empresa ouvir o território (município, região, Estado, País) e instituições sociais nele presentes (governos, sindicatos, demais empresas, instituições de ensino e pesquisa, entre outros). Desde que pagos os impostos e os direitos trabalhistas, não cabe ao território e às instituições interferirem no processo.

Por conseguinte, como se verá, as proposições que apresento neste artigo vão na contramão dos princípios e das ideias liberais ou neoliberais.

Os liberais em geral acreditam que a função social da empresa é cumprida quando ela gera empregos, recolhe tributos e gera retorno para seus acionistas, estimulando sua continuidade. Nós, economistas não alinhados com as ideias neoliberais, entendemos que a função social da propriedade vai muito mais longe: ela inclui a responsabilidade social e ambiental.

Uma decisão unilateral que só considera o lucro dos acionistas e deixa uma comunidade no abandono, desempregada, privada das receitas tributárias e do incentivo à atração de fornecedores e prestadores de serviços, acrescentando o problema dos vazios urbanos e galpões inativos para a própria comunidade solucionar, não corresponde absolutamente ao conceito de função social da propriedade inscrito na Constituição.

A expansão recente do fechamento e transferência de fábricas no Brasil

Mais de 4450 indústrias de transformação, dos mais diferentes portes e segmentos, “fecharam suas portas” em 2015 no Estado de São Paulo. Este número de encerramento de plantas industriais é 24% superior ao verificado em 2014, quando 3.584 fábricas deixaram de operar. Os números são da Junta Comercial e foram veiculados pela imprensa no início deste ano. As informações referem-se ao Estado, mas o fenômeno acontece em todo o país.

Em alguns casos, o fechamento puro e simples da unidade produtiva é o único movimento realizado pela empresa. Em outros, verifica-se fechamento da unidade e transferência das atividades para outras localidades. Segundo as empresas, na grande maioria dos casos o agravamento da crise da economia brasileira é a causa principal do fechamento de fábricas.

Este processo é muito preocupante, porque o expressivo número de encerramento de fábricas não se observava no Brasil desde os draconianos tempos de crise e reestruturação produtiva da década de 1990, quando vivíamos sob a hegemonia das políticas neoliberais. A preocupação com a crise atual da indústria brasileira (e o consequente fechamento de fábricas) cresce ainda mais porque a tendência é o seu agravamento, em função do acirramento da crise econômica.

São vários os exemplos recentes de fechamento de fábricas pelo país. Citaremos apenas alguns dos casos para ilustrar.

Na Região do ABC, o Grupo SEB (cuja sede fica na França) declarou, no último dia 16/02/2017, que irá fechar a tradicional fábrica da Panex em São Bernardo. São aproximadamente 200 trabalhadores na planta que terão seus empregos eliminados. O grupo é dono de marcas como Arno, Clock, Panex e Rochedo. De acordo com a empresa, a produção que é feita em São Bernardo será transferida para “a nova planta de Itatiaia, na região sul do Rio de Janeiro. Os trabalhadores da Panex reagiram imediatamente e estão acampados na frente da fábrica, com o objetivo de impedir a saída de maquinário e realizar tratativas para a manutenção da unidade.

Em abril de 2016, foi anunciado o fechamento da tradicional fábrica de produtos Arno no bairro da Moóca, na Cidade de São Paulo. De propriedade do Grupo SEB, a fábrica produzia eletroportáteis (liquidificadores, aspiradores, ventiladores etc.) e empregava 625 pessoas. Mais de 450 empregos foram afetados em função da transferência das atividades de produção para Itatiaia, no sul do Rio de Janeiro. A princípio, as fábricas do mesmo grupo localizadas em São Bernardo do Campo e em Jaboatão (PE) continuariam operando sem alterações. O Grupo SEB é também detentor das marcas Panex, Krups, Clock, Rochedo, T-Fal e Lagostina.

Ainda no Estado de São Paulo, outros exemplos emblemáticos de fechamentos de fábricas ocorreram em Guarulhos, Americana, Jacareí e Sorocaba. Em Guarulhos, as empresas metalúrgicas Eaton, Maxion e Randon anunciaram encerramento de atividades produtivas e plantas industriais. Em Americana, a Polyenka, empresa fabricante de produtos têxteis, que chegou a ter mais de dois mil empregados no final da década de 1990, declarou, em janeiro deste ano, o encerramento das atividades. Em Jacareí, outro fabricante de produtos têxteis, a Rhodia (do grupo Solvay), já havia decidido fechar a fábrica na cidade e concentrar a produção em Santo André. No segmento siderúrgico, a Gerdau também anunciou, em julho de 2014, o fechamento de sua fábrica em Sorocaba, com a transferência da produção do laminador para a fábrica da empresa em Mogi das Cruzes.

No Paraná, apenas para citar um exemplo fora de nosso estado, a PK Cables do Brasil, empresa de autopeças, produtora de componentes elétricos (chicotes), anunciou, em dezembro de 2015, a desativação de sua produção em Curitiba. O mesmo grupo já tinha havia encerrado as atividades em Itajubá (MG).

Regulamentar o fechamento e transferência de fábricas

Em 2001, quando ainda era assessor do DIEESE no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, ajudei a elaborar propostas sobre o assunto do fechamento e transferência de fábricas. A intenção era provocar o debate e propiciar subsídios às discussões do movimento sindical, entidades representativas do empresariado brasileiro e poderes executivo, legislativo e judiciário. Na prática, nosso objetivo era oferecer um norte para a elaboração de um Código de Conduta Social (a ser transformado em Lei), que regulamentasse o fechamento e a transferência de estabelecimentos produtivos no Brasil. Transcorridos quase duas décadas, as proposições continuam válidas, a nosso ver.

As causas e consequências que envolvem o fechamento de fábricas foi o tema do meu livro “Quando o apito da fábrica silencia: sindicatos, empresas e poder público diante do fechamento de indústrias e da eliminação de empregos na Região do ABC” publicado pela Editora ABCDMaior em 2008. O livro, cuja edição impressa está esgotada, pode ser eletronicamente obtido na íntegra em http://blogjeffdac.blogspot.com.br

Proposta de Código de Conduta Social para as empresas que realizam fechamento e transferência de estabelecimentos produtivos no Brasil

Os inúmeros estabelecimentos produtivos (...) desativados nos últimos anos no país, e os efeitos perversos dessas desativações sobre regiões e comunidades inteiras tornam nítida a necessidade da revisão das regras que regem a abertura e o fechamento de estabelecimentos produtivos no Brasil.

Em um ambiente de desmedida flexibilidade das leis, acompanhado muitas vezes pelas benesses da guerra fiscal, verifica-se a ampliação de processos de “racionalização” da produção promovida pelas grandes empresas estrangeiras e nacionais. Entre esses processos está a transferência da atividade produtiva de uma localidade para a outra, isto é, determinado estabelecimento é fechado e a sua produção (normalmente acompanhada do maquinário) repassada para outros estabelecimentos da mesma empresa ou grupo econômico.

As empresas argumentam que a transferência de estabelecimentos não traz perda para o país como um todo, à medida que os empregos, os tributos e a tecnologia seriam meramente deslocados de uma região para outra. Sabe-se, no entanto, que isso não acontece. Na maior parte dos casos, tem ocorrido perda líquida de empregos. Perdem-se também os poucos centros de pesquisa e desenvolvimento instalados nas antigas áreas. Por fim, a guerra fiscal trata de reduzir a arrecadação em geral.

Os efeitos das desativações sobre as comunidades costumam ser catastróficos e via de regra não fazem parte do cálculo empresarial: o desemprego, a queda de arrecadação, a diminuição da qualidade de vida e os vazios urbanos (na forma de galpões abandonados nas cidades) são apenas alguns deles. Anos de desenvolvimento tecnológico e de know-how dos trabalhadores e fornecedores são relegados ao segundo plano.

As propostas que se seguem visam subsidiar o debate na sociedade brasileira para a elaboração de projeto de lei para regulamentar a transferência de unidades produtivas no país.

As propostas

1 Aviso prévio: A empresa avisará aos sindicatos de trabalhadores e autoridades locais (Prefeitura, por exemplo), com antecedência mínima de 12 meses, da intenção de encerrar as atividades produtivas de determinado estabelecimento produtivo e a transferência da produção para outras unidades da empresa ou grupo econômico.

2 Transferência dos empregos: Aos trabalhadores da planta em desativação será obrigatoriamente oferecida pela empresa a opção de realocação para outra unidade produtiva da empresa no país, ou em seus fornecedores, quando houver acordo para isso. Os funcionários terão a garantia de realocação em função compatível com a que possuíam na antiga unidade, ressalvados os casos de promoção. No caso da aceitação pelo funcionário do seu deslocamento geográfico para outra unidade produtiva no país, será concedida estabilidade no emprego por 24 meses contados a partir da data do seu deslocamento.

3 Voluntariado: A demissão voluntária, quando ocorrer, deverá ter o pagamento mínimo de x% do salário mensal para os trabalhadores que tiverem acima de “y” anos de tempo de casa; e de z% para os trabalhadores com tempo de casa inferior.

4 Garantia de curso de requalificação: Para os trabalhadores do voluntariado, a empresa deverá garantir curso de requalificação, a ser formulado em conjunto com o sindicato de trabalhadores da respectiva categoria profissional.

5 Cooperativas: Sempre que não houver um comprador imediato das instalações e do maquinário do antigo estabelecimento produtivo que viabilize o prosseguimento das atividades e dos empregos, os trabalhadores demitidos pela antiga empresa terão direito à compra dos respectivos ativos, visando à constituição de cooperativas de trabalhadores. Essa compra contará com a facilitação das verbas rescisórias e com a criação de linhas de financiamento diferenciadas por parte do BNDES.

6 Revitalização dos “vazios urbanos”: A empresa que realizar transferência de estabelecimentos ficará responsável pelo pagamento do IPTU integral da mesma área, pelo período de mais dois anos, a partir da data do encerramento das atividades de produção. Durante esse período, o recurso deverá ser obrigatoriamente utilizado pela prefeitura para o apoio a projetos de revitalização da área, especialmente na forma de atração de novas unidades produtivas no local.

7 Recuperação ambiental: As áreas desativadas por processos de transferência de estabelecimentos serão objeto de laudo ambiental realizado pela Prefeitura local. Os custos para a realização desses laudos serão pagos pela empresa que realiza a transferência. Nos casos em que forem diagnosticados problemas ambientais, fruto da atividade produtiva anterior, a Prefeitura deverá prever os recursos financeiros necessários para a recuperação ambiental da área. Esses recursos serão cobrados da empresa que realizou a transferência e somente poderão ser utilizados para esse fim.

8 FAT: Não será permitida a captação de recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) para gastos relativos ao fechamento de estabelecimentos produtivos, tais como pagamento de verbas rescisórias.

9 Multa: o não cumprimento dessa lei tornará a empresa sujeita à multa”.

Jefferson José da Conceição é Prof. Dr. e atual Gestor da Escola de Negócios (Adm,, Cienc. Cont, Econ. e Com. Ext.) da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS). Foi Secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo de São Bernardo (jan.2009-jul.2015); Superintendente do SBCPrev (agos.2015-fev.2016); Diretor Técnico da Agência São Paulo de Desenvolvimento (mar.2016-jan.2017). Economista licenciado do DIEESE.

Publicado no site do ABCDMaior, em 20/2/2017.

segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

EMPREENDEDORISMO E INCUBAÇÃO VIRTUAL




Jefferson José da Conceição (jeffdacsenior@gmail.com)

Este artigo é uma versão de outro que publiquei, juntamente com Alessandra Rosa, em 2/8/2016, no site do ABCDMaior.

Volto ao tema com o objetivo de fomentar o debate entre o público em geral, mas em especial os professores e alunos de áreas relacionadas como Administração, Economia, Contábeis e Comércio Exterior, sobre a importância da reflexão permanente de como apoiar o empreendedorismo dos estudantes, na forma de empreendimentos iniciantes, start ups, empresa junior entre outros. A incubação virtual é uma dessas possibilidades.

Assim, o artigo pretende destacar o papel contemporâneo das Incubadoras virtuais, sem deixar de realçar a riqueza e relevância das Incubadoras que têm uma base física.

A partir da exploração das potencialidades abertas pelas diversas plataformas eletrônicas de comunicação, e das experiências já em curso internacionalmente e também no Brasil, as incubadoras virtuais devem ser vistas como uma opção avançada e complementar ao rol de mecanismos existentes de apoio ao empreendedorismo.

As incubadoras virtuais possibilitam uma resposta adequada ao crescente número de empreendimentos que buscam a sua participação em Incubadoras. Estas formas novas de incubadoras permitem um intenso diálogo com o público jovem, cada vez mais “conectado” e participante do mundo virtual.

O que é uma incubadora de empresas

A palavra “incubação”, na biologia, diz respeito ao processo segundo o qual determinados animais ovíparos chocam os seus ovos, e, dentro destes ovos, ocorre o crescimento e o desenvolvimento do embrião até à sua eclosão. Portanto, este conceito biológico certamente inspirou o uso do termo “incubação” para o tipo de apoio acolhedor proporcionado pelas incubadoras de empresas aos empreendimentos nascentes.

O interesse pelas incubadoras cresceu acompanhando a atenção crescente dada à temática do empreendedorismo em todo o mundo. A partir das primeiras experiências surgidas na década de 1950 nos EUA, e espraiadas celeremente nos anos de 1980 nos EUA e Europa, as incubadoras de empresas ou “incubadoras” têm como objetivo estimular o surgimento e o desenvolvimento de micro e pequenos empreendimentos, por meio do suporte a estes em seu estágio ainda inicial. Estes empreendimentos podem estar ligados às áreas tecnológicas de fronteira; manufaturas industriais tradicionais; serviços; economia criativa; Economia Solidária, entre outras.

O suporte e consultoria aos empreendimentos nascentes, fornecido por equipe técnica ligada à Incubadora, varia por tipo de incubação. Grande parte das vezes, o apoio ocorre relacionado aos seguintes aspectos:

●     Cursos de capacitação, formação e treinamento;

●     apoio técnico em relação ao produto e processo de produção;

●     suporte à gestão contábil, administrativa, financeira e jurídica do negócio;

●     assistência à comercialização;

●     marketing;

●     orientação em relação à estruturação do Plano de Negócios;

●     gestão da propriedade intelectual.

As incubadoras não podem ser vistas como condomínio ou mero espaços de coworking. Sendo mais do que isso, elas costumam permitir também o compartilhamento de espaços, equipamentos, infraestrutura, recursos humanos. Em muitos dos casos, estes custos são divididos entre os incubados.

Por meio de um ambiente de colaboração, as incubadoras costumam propiciar troca de ideias e contatos, viabilizando parcerias e redes cooperativas que ajudam no crescimento dos empreendimentos e no acesso ao mercado.

O tempo de incubação dos empreendimentos também costuma variar bastante entre as incubadoras.  De acordo com a Associação Nacional de Entidades Promotoras de Empreendimentos Inovadores – ANPROTEC, o tempo médio de incubação entre as incubadoras é de três anos (36 meses), mas este tempo pode ser maior ou menor, dependendo de elementos como tipo de negócio; tempo necessário para pesquisa e desenvolvimento; nível de faturamento.

Ainda de acordo com estudo da ANPROTEC em parceria com o SEBRAE, o Brasil tem hoje 369 incubadoras em operação, abrigando 2.310 empresas incubadas e 2.815 empresas graduadas, com a geração de 53.280 postos de trabalho e faturamento que passa os R$15 bilhões.

National Business Incubation Association (NBIA), organização internacional sediada nos EUA, estima a existência de mais de 7.000 incubadoras em todo o mundo.

Incubadoras e inovação tecnológica

Constitui-se em objetivo da incubação o apoio à geração de inovação tecnológica. Evidentemente, este objetivo é primordial nas incubadoras de base tecnológica. Contudo, a inovação (de processo, produto, gestão ou comercialização) não é e nem deve ser exclusivo das incubadoras de base tecnológica.

Por exemplo, as incubadoras que têm forte ênfase na inclusão social, cooperativismo e combate à vulnerabilidade social, como o caso das Incubadoras de Empreendimentos Solidários, também devem buscar estimular a inovação nos projetos, pois isto significa, entre outros, maiores chances de sobrevivência e expansão de mercados. Por isto, muitas das incubadoras, dos diferentes tipos, estão ligadas às universidades e centros de pesquisa.

Conforme define a ANPROTEC:

“Incubadoras de empresas (...) são entidades promotoras de empreendimentos inovadores. A incubadora de empresas tem por objetivo oferecer suporte a empreendedores para que eles possam desenvolver ideias inovadoras e transformá-las em empreendimentos de sucesso. Para isso, oferece infraestrutura e suporte gerencial, orientando os empreendedores quanto à gestão do negócio e sua competitividade, entre outras questões essenciais ao desenvolvimento de uma empresa”.

Muitas incubadoras em estágio mais avançado buscam também estimular e apoiar a ligação dos empreendimentos com as empresas privadas, de forma a viabilizar parcerias do tipo “investimento-anjo” (feito por pessoas físicas com seu capital próprio em empreendimento nascente com elevado potencial de crescimento), “capital semente” (feito por pessoa jurídica em empreendimentos nascentes, mas com estágio mais avançado em termos de clientes, definição de produtos) e “venture capital" (capital de risco).

Outra dimensão importante reside no apoio da incubadora à estruturação dos projetos dos empreendimentos para a captação de recursos públicos disponibilizados por instituições de fomento.

Gestão de Incubadoras

Embora existam incubadoras que objetivam o lucro (as incubadoras-com), a grande predominância é de incubadoras não lucrativas. Estas incubadoras que não visam o seu próprio lucro costumam ser organizadas e geridas por instituições como Governos, Agências de Desenvolvimento Econômico, Universidades, Instituições de Fomento, Organizações mistas (como Parques Tecnológicos) ou Organizações Não Governamentais - ONGs.

Para o poder público, apoiar a constituição de incubadoras é importante, porque elas, se bem estruturadas em suas finalidades, parcerias e formas de gestão, contribuem para fomentar o empreendedorismo; a inovação tecnológica; a diversificação da economia; o crescimento econômico; a expansão da venda dos produtos da região para outras; a geração de oportunidades qualificadas de trabalho. Em suma, as incubadoras podem se constituir em instrumentos do desenvolvimento local.

Há várias formas de se avaliar o êxito de uma incubadora. A qualidade das suas instalações; as parcerias que realizou; a composição e participação do Conselho consultivo, que deve ser constituído por representantes de instituições relevantes; o tempo médio de incubação dentro dos padrões estabelecidos; a falta de capacitação e ensino relevantes na temática do empreendedorismo; o número de empreendimentos incubados que obtiveram sucesso após sair da incubadora; a baixa taxa de mortalidade; o grau de cumprimento das metas estabelecidas para a incubadora – estão entre estes indicadores.

O que são Incubadoras Virtuais

As incubadoras físicas possuem incubados “residentes” e estão instaladas em prédios, galpões, áreas de universidades e outros espaços construídos ou adaptados para abrigar, temporariamente, o empreendimento nascente. 

Comumente, as incubadoras físicas possuem baias (salas de trabalho) para cada estabelecimento, sala de reunião, auditório, secretaria, serviços de comunicação (telefone e internet) e espaços para networking entre os estabelecimentos e entre estes e os vários parceiros – professores, empresários, gestores públicos. Em determinadas incubadoras, encontram-se também espaços para instalações laboratoriais.

Nesta década, as incubadoras vêm tomando novas formas, sem necessariamente perder a importância da unidade física em muitos dos casos.

Entre as novas formas estão as incubadoras virtuais. 

Diferentemente da incubadora física, a incubadora virtual não tem paredes. Seu espaço, como o próprio nome diz, é virtual, por meio de plataformas eletrônicas de comunicação. Isto viabiliza redução de custos da operação, como aluguel, manutenção predial, deslocamentos e estacionamentos.

Os serviços prestados pela Incubadora Virtual costumam ser muito semelhantes aos de uma Incubadora física: apoio à capacitação, gestão técnica, gestão financeira, networking, entre outros. Entretanto, o modelo de incubação virtual costuma apostar na maior facilidade que a incubadora virtual pode oferecer em termos de troca de ideias e parcerias entre os incubados e entre estes e parceiros estratégicos.

Vale mencionar que o conceito de incubação virtual derivou, em muitos dos casos, da própria evolução das incubadoras físicas.  

Assim, em 2006, o NBIA constatou:

“Mais de 50% dos programas de incubação relataram que também prestavam serviços a clientes virtuais, que não estavam instalados nas dependências da incubadora. Os clientes muitas vezes estavam situados em casa ou tinham suas próprias instalações fora das incubadoras físicas”.

Um exemplo deste modelo no Brasil é o da Incubadora de Empresas de Base Tecnológica de São Paulo – USP/Ipen, gerida pelo Centro de Inovação, Empreendedorismo e Tecnologia, CIETEC. 

A incubadora do CIETEC é um dos maiores pólos de incubação de empresas de base tecnológica da América Latina. Os empreendimentos aprovados podem ser inserir na modalidade Pré-incubação residente (para projetos em fase inicial de desenvolvimento); Hotel de projetos; Incubação residente; Incubação residente de empresas de tecnologia de Informação e comunicação (TIC); Pós-incubação residente (para empresas em fase operacional, preferencialmente graduadas na incubadora); Incubação não residente de empresas de base tecnológica; Pós-incubação não residente de empresas de base tecnológica.

Acrescente-se que as incubadoras virtuais possibilitam também incubar um maior número de empreendimentos incubados. Isto viabiliza, pelo menos em parte, o atendimento a procura crescente de pessoas que almejam ter seus projetos conectados a uma incubadora de referência.

Da mesma forma que acontece com as incubadoras físicas, o sucesso de uma incubadora virtual depende de muitos fatores: os serviços prestados; as plataformas eletrônicas de comunicação utilizadas; a capacidade de interatividade do portal ou site; o efetivo envolvimento de entidades parceiras e empresas; a gestão e sustentabilidade financeira da incubadora, entre outros.

Por último, mas não menos importante, é o fato de que as incubadoras virtuais dialogam bem com o mundo dos jovens, cada vez mais virtual. Assim, o jovem brasileiro, tal como os jovens em todo o mundo, é cada vez mais participante de um mundo virtual.

A Pesquisa “Juventude Conectada”, da Fundação Telefônica, realizada em 2014 com 1440 jovens entre 16 e 24 anos, nas cinco regiões do País, mostrou que 52% dos entrevistados acreditam totalmente ou quase totalmente que a internet: 1) acelera o desenvolvimento de projetos; 2) estimula a inovação/geração de ideias e novas soluções; 3) ajuda no desenvolvimento da carreira profissional.

A pesquisa também mostrou que 45% dos jovens concordam que a internet é um ambiente que contribui para o espírito empreendedor e 41% que ela permite levantar dinheiro e/ou financiamento para a realização de projetos e novos negócios, especialmente no apoio às startups.

Incubadoras Virtuais, Plano de Negócios e Inovação Tecnológica

Entre os serviços prestados por uma incubadora virtual, assim como os prestados pelas incubadoras físicas, vale especial menção ao apoio à elaboração do Plano de Negócios da incubada, pois diversos estudos relacionam a “mortalidade” das empresas nascentes com a falta de um sólido planejamento.

A importância do Plano de Negócios foi assim expressa pelo Prof. Guilherme Ary Plonski, da Escola Politécnica da USP, membro do IPT e da ANPROTEC: “O Plano de Negócios [é] instrumento de planejamento, isto é, busca redução de incerteza”.

Na mesma linha segue o Prof. José Dornelas, um dos maiores estudiosos sobre o tema incubação de empresas, em seu estudo “Planejando Incubadoras de Empresas”:

“O Plano de Negócios assume papel de destaque neste processo, haja visto que, além de servir de ferramenta de planejamento, serve também como ferramenta-padrão exigida pelas entidades de fomento (...) para a análise e concessão de recursos financeiros e econômicos, essenciais à sua operação”.

Registre-se ainda que os serviços da incubadora virtual podem e devem ser complementados com reuniões presenciais (face to face) regulares entre os incubados e entre estes e os mentores, representantes de empresas, gestores públicos entre outros parceiros, realizadas em lugares previamente acordados (não raro, na sede de uma das entidades parceiras da incubadora).

Neste sentido, a utilização de laboratórios de universidades e centros de pesquisa pode ser objeto de discussão e contratação pela incubadora para o apoio aos seus incubados. Por outro lado, as incubadoras virtuais de empresas estão sendo cada vez mais apoiadas por centros de excelência em atividades de inovação tecnológica, como é o caso do Vale do Silício, nos EUA.

Também para as incubadoras virtuais vale o registro da necessidade de que os encontros presenciais sejam devidamente planejados, para que se estimule a criatividade e a interação entre os empreendimentos incubados, e entre estes os diversos parceiros da incubadora.

Jefferson José da Conceição é Prof. Dr. e atual Gestor da Escola de Negócios (Adm,, Cienc. Cont, Econ. e Com. Ext.) da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS). Foi Secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo de São Bernardo (jan.2009-jul.2015); Superintendente do SBCPrev (agos.2015-fev.2016); Diretor Técnico da Agência São Paulo de Desenvolvimento (mar.2016-jan.2017). Economista licenciado do DIEESE.

Publicado no site do ABCDMaior, em 13/2/2017

quinta-feira, 9 de fevereiro de 2017

SOBRE A AGÊNCIA DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DO GRANDE ABC


Jefferson José da Conceição (jeffdacsenior@gmail.com)

Debate-se neste momento os rumos da Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC.  Esperamos que os representantes dos vários segmentos da Região - Consórcio Intermunicipal, representações empresariais, Sindicatos de trabalhadores, Universidades, entre outros – cheguem a um consenso em torno de uma “pactuação”, que garanta a continuidade da Agência.

Neste artigo, vamos nos ater a resgatar alguns elementos que estavam presentes no processo de formação da Agência, no final dos anos de 1990.

Criada em 1998, fruto de um Acordo Regional, a Agência de Desenvolvimento do Grande ABC teve como seu primeiro presidente o Prefeito Celso Daniel. O Governo do Estado, então liderado pelo Governador Mario Covas, também teve papel importante neste acordo regional.

Atualmente, o Presidente do Conselho Diretor da Agência é o Professor Joaquim Celso Freire Silva, do corpo docente da Universidade Municipal de São Caetano do Sul, USCS.

A Agência foi uma construção acordada formalmente na Câmara Regional do ABC, que funcionou na segunda metade dos anos de 1990. A Câmara Regional foi um espaço que integrava os atores públicos, privados e da sociedade civil em mesas de articulação, discussão e negociação sobre temas diversos de interesses dos sete municípios (economia, infraestrutura, saúde, segurança, meio ambiente, cultura, entre outros).

Participaram da Câmara Regional o Consórcio Intermunicipal Grande ABC (formado pelas sete Prefeituras), o Governo do Estado de São Paulo, os Legislativos municipais, os parlamentares do ABC na Assembleia Legislativa e no Congresso Nacional, o Fórum da Cidadania, as associações empresariais, os Sindicatos de Trabalhadores, dentre outros.

A Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC é uma instituição não governamental, sem fins lucrativos. Desde o seu início, a Agência tem como principal missão dar suporte institucional aos trabalhos e acordos da Câmara (quando da existência desta) e ser o “braço executivo” do Consórcio Intermunicipal na área do desenvolvimento econômico.

Mais especificamente, compete à Agência:

a)   Implementar o marketing regional (divulgando, interna e externamente, as potencialidades da região);

b) Disponibilizar um banco de informações regionais (com base na sistematização dos indicadores já existentes e na criação de outros);

c)  Desenvolver atividade de apoio e fomento às empresas (por meio, entre outros fatores, da captação e do repasse de recursos para financiamento de projetos prioritários ao desenvolvimento regional, sobretudo de micros, pequenos e médios empreendimentos.

Quando da sua criação, a Agência tinha como sócios o Consórcio Intermunicipal (que envolve as sete prefeituras), as quatro diretorias regionais do Centro de Indústrias do Estado de São Paulo (CIESP); as Associações Comerciais e Industriais dos sete Municípios; os Sindicatos de Trabalhadores (Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, Sindicato dos Químicos do ABC, Sindicato das Costureiras, Sindicato da Construção Civil); o Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE), as empresas do Polo Petroquímico regional (Petroquímica União, Solvay, Cabot, Polietilenos União, Polibrasil, Crevron, Oxicap e Petrobrás) e as universidades (IMES – atualmente USCS, UNI-A, Fundação Santo André, UNIBAN, UNIABC, Metodista, FOCO). Posteriormente, algumas entidades deixaram a Agência e outras entraram, como o Sindicato dos Bancários do ABC e a UFABC.

A composição do capital da Agência deveria expressar sua natureza mista, não estatal: 51% das cotas relativos aos custos da instituição referem-se à sociedade civil e 49% ao Consórcio Intermunicipal do ABC.

Experiências internacionais inspiraram a Agência de Desenvolvimento do Grande ABC

A Agência de Desenvolvimento Econômico do ABC inspira-se na experiência de agências de alguns países europeus. Uma delas é a Agenzia Sviluppo NordMilano– ASNM, que é a agência de desenvolvimento de Sesto San Giovanni, cidade italiana que faz parte da região metropolitana de Milão. A cidade de Sesto San Giovanni, que tem um pouco menos que 100 mil habitantes, também sofreu nas últimas décadas com a saída de empresas, desemprego e queda da qualidade de vida.

Situada ao nordeste de Milão, Sesto San Giovanni é uma tradicional região industrial italiana, com características tipicamente fordistas. Ao longo do século XX, a região abrigou empresas de grande porte como Pirelli, Magnetti Marelli, Breda e Campari. Desta maneira, ela atraiu grande número de imigrantes do sul do país. A população subiu de 5 mil pessoas nos primeiros anos do século XX para 98 mil nos anos de 1980.

A crise da indústria metalúrgica de Sesto San Giovanni (que gerou o fechamento de fábricas da Falk, Magnetti Marelli e Breda, entre outras) associada à modernização das empresas, a partir dos anos 80, resultou em acentuado corte de empregos (na indústria siderúrgica, o nível de emprego caiu de 30 mil para 5 mil postos de trabalho, após a década de 1980). Aproximadamente 25% do seu território constituem-se em áreas abandonadas.

Nos últimos anos, a região de Sesto San Giovanni vem buscando implementar processos de cooperação entre os atores e atrair atividades de alto valor agregado, em especial no segmento de serviços avançados, como o de comunicações. Situação similar a que passa, nos últimos anos, a Região do Grande ABC Paulista.

Estes processos de cooperação estimularam a construção de parcerias entre o Setor público e o setor privado, lideranças políticas e representações sindicais. Uma das prioridades da Agência de Sesto San Giovanni é o desenvolvimento do setor de serviços ligados à indústria de alta tecnologia.

Outra experiência de agência bem sucedida é a do Vale do Ruhr, na Alemanha. Nesta região, constituiu-se, com base na mobilização e aproximação de diversos atores sociais (Estado, setor privado, sindicatos e outros membros da sociedade civil) uma agência de desenvolvimento regional, que tem a função de elaborar políticas de desenvolvimento econômico local.

Agência de Desenvolvimento e Competitividade Regional

O objetivo da Agência de Desenvolvimento do Grande ABC, de apoio aos pequenos e médios empreendimentos na região, está respaldado em uma linha de pensamento que acredita em fortes ganhos de competitividade que surgem quando há uma aproximação espacial e relacional entre as pequenas e médias empresas e entre estas e as instituições locais (associações comerciais, sindicatos, universidades, agências de desenvolvimento, etc).

Neste sentido, alguns estudiosos procuraram investigar os determinantes econômicos, sociais e culturais de determinadas formações locais flexíveis. Grande parte da literatura veio a denominar estas formações de clusters ou aglomerações de empresas.

Vários autores definem estas unidades territoriais socioeconômicas – clusters, milieu ou Arranjos Produtivos Locais (APLs) – a partir dos seguintes parâmetros:

a)        concentração espacial dos agentes econômicos em nível local;

b)        oferta de recursos humanos com boa qualificação profissional;

c)         intensa troca de informações entre agentes, instituições e indivíduos;

d)        existência de uma estrutura institucional desenvolvida;

e)      formação e consolidação de uma identidade sociocultural, o que permite a cooperação baseada na confiança recíproca dos agentes.

Muitos dos trabalhos que se debruçam sobre esta questão partem dos estudos de Alfred MARSHALL (1890) e seus conceitos de distrito industrial e de economias positivas externas (à empresa), que derivam da aglomeração espacial das empresas – em especial as pequenas e médias - em determinado território.

Marshall argumenta que os distritos industriais viabilizam:

1) existência de uma mão-de-obra qualificada;

2) spillovers (palavra que, ao pé da letra, significa “transbordamentos”) de inovação entre empresas fornecedoras e clientes e até mesmo entre empresas concorrentes, e;

3) processos de cooperação entre as empresas.

O conceito de distrito, como se observa, enfatiza as ligações horizontais entre as empresas, e entre estas e os agentes econômicos presentes no território. Considera-se que a proximidade espacial pode fazer emergir um ambiente competitivo em função de complexos fatores industriais, sociais e culturais, que permitem a constituição de redes sociais e econômicas baseadas na coesão e na confiança recíproca entre os atores e instituições sociais. Neste contexto, o território se tornaria uma área de concentração de externalidades positivas.

Algumas das contribuições da Agência de Desenvolvimento Econômico Grande ABC

Não é objetivo desse artigo fazer um resgate de todas as contribuições já realizadas pela Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC. No entanto, vale destacar algumas delas:

a)           O desenvolvimento de um banco regional de dados econômicos e sociais;

b)      A construção de uma imagem da Região do ABC institucional, política, econômica e socialmente mais integrada, perante atores e instituições internos e externos à Região;

c)          Os convênios de cooperação com o BNDES, para a divulgação das políticas de apoio do banco às micro e pequenas empresas em termos de linhas de financiamento;

d)           As parcerias com outras instituições financeiras para divulgação de seus respectivos programas de crédito mais vantajosos às empresas e empreendedores;

e)           Os convênios de cooperação técnica e financeira com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – SEBRAE;

f)             Os seminários, eventos e reuniões para enfrentamento de crises econômicas na Região e no Brasil;

g)           A realização de Inventário de Oferta e Demanda de Serviços Tecnológicos do Grande ABC;

h)        A busca de uma perspectiva regional para temas centrais que interessam aos sete municípios, como é o caso de Parques Tecnológicos;

i)             A coordenação de Arranjos Produtivos Locais (APLs) Regionais;

j)             A difusão em nível regional de projetos bem-sucedidos em âmbitos municipais, como foi o caso do Turismo Industrial;

k)            A promoção de ações de fomento ao comércio exterior;

l)             A realização de feiras e eventos;

m)          A implementação de cursos de capacitação;

n)           A elaboração de materiais institucionais de divulgação da Região do ABC, como o caso de livros, cadernos econômicos, revistas, dentre outros.

É claro que há ainda muito a ser feito para que a Região fortaleça, de maneira conjunta, o caminho do seu desenvolvimento. Mas, indubitavelmente, houve avanços importantes com a criação da Agência.

Outro ponto digno de registro é a necessidade de permanente diálogo entre a Agência e as Secretarias Municipais de Desenvolvimento Econômico, para que as políticas desenvolvidas possam ser complementares, evitando duplicação de esforços e eventuais conflitos de visões. Mas, aqui também, o histórico mostrou que este diálogo é possível.

Ao modo de conclusão

A Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC - que, como vimos, foi fruto de um amplo debate - representou, ao final dos anos de 1990, a visão de futuro das principais lideranças regionais, estaduais e federais, lideradas, entre outros, por Celso Daniel e Mário Covas.

Transcorridas duas décadas de experiência, qualquer instituição pode e deve discutir aperfeiçoamentos, ajustes e mudanças. Assim também acontece, é claro, com a Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC.

Entretanto, por todas as razões acima apontadas - acrescido do fato de que a Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC é, no campo econômico, uma das poucas instituições existentes no Brasil que avançam para um formato intermunicipal - é que, a nosso ver, as instituições integrantes da Agência, por meio dos seus atuais representantes, devem envidar esforços para acordarem as bases que garantam a existência e o fortalecimento desta entidade.

Jefferson José da Conceição é Prof. Dr. e atual Gestor da Escola de Negócios (Adm,, Cienc. Cont, Econ. e Com. Ext.) da Universidade Municipal de São Caetano do Sul (USCS). Foi Secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo de São Bernardo (jan.2009-jul.2015); Superintendente do SBCPrev (agos.2015-fev.2016); Diretor Técnico da Agência São Paulo de Desenvolvimento (mar.2016-jan.2017). Economista licenciado do DIEESE.

Artigo publicado no site do ABCDMaior, coluna blog, em 9/2/2017.