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segunda-feira, 26 de outubro de 2015

COMO O GOVERNO DILMA PODE SAIR DE UMA AGENDA NEGATIVA PARA O DESENVOLVIMENTO - O EXEMPLO DE JK


Jefferson José da Conceição e Roberto Vital Anav

De forma semelhante ao que presenciamos no Brasil de hoje, em que o Governo Dilma enfrenta uma agenda negativa e cujo “palco de guerra” é o Congresso Nacional, o Governo do Presidente Juscelino Kubitshchek (JK) - 1956 a 1961 – também teve que partir de um ambiente de forte pessimismo e instabilidade política, cujo epicentro era o parlamento. Entretanto, JK conseguiu desvencilhar-se da agenda negativa e conduzir o Brasil rumo ao desenvolvimento. O Governo JK é modelo para Governo Dilma.

A instabilidade política caracterizou o fim do segundo Governo de Getúlio Vargas (1951-1954) - instabilidade esta que levou ao suicídio do Presidente. A partir daí expandiram-se ainda mais os conchavos e conluios em torno de golpes de estado. O Governo Café Filho (que vai de agosto de 1954 até novembro de 1955) é marcado por este ambiente. A economia também contribuiu para este quadro. Verificava-se uma preocupante elevação inflacionária e queda das exportações de produtos agrícolas. O Brasil – não tão diferente dos dias atuais – era um “barril de pólvora”.

De 1950 a 1964, a sociedade também vivia lutas por ampliação de direitos sociais - do direito de greve às reformas de base (incluindo a reforma agrária).No Brasil de hoje, o avanço dos direitos sociais desde a "Constituição cidadã" de 1988, e mais ainda as conquistas sociais nos últimos doze anos (2003-2015), não eliminou a necessidade de prosseguir a luta pela inclusão social. Estes avanços e conquistas do período recente trouxeram ao primeiro plano as demandas de segmentos desde sempre marginalizados, massacrados ou discriminados: negros, mulheres, minorias sexuais, povos indígenas.

Em um mundo então dominado pela tensa “guerra fria” e pelo macarthismo (política de perseguição a supostos quadros simpatizantes do comunismo), JK - jovem médico e político idealista nascido em Diamantina, Minas Gerais -, candidato a presidente da República, era acusado de compactuar com os comunistas. João Goulart (Jango), líder do PTB, foi o vice-presidente na chapa de JK. Ex- Ministro do Trabalho de Getúlio, responsável pelo aumento de 100% no salário mínimo (1954) e muito ligado ao sindicalismo, Jango era acusado pela oposição conservadora de pretender implantar no Brasil uma “república sindicalista”, vista como foco do “perigo vermelho” à época. Foram várias as pressões, manobras e trapaças para frear a expansão da candidatura de JK-Jango ao longo de todo o ano de 1955.

O Brasil de Dilma também convive hoje com certa “caça aos comunistas”, como mostraram os inúmeros cartazes das mobilizações recentes na Av. Paulista. Contudo, o atual movimento anticomunista é fora de época e lugar. Um quarto de século após o fim da Guerra Fria, quando a China atinge o segundo lugar entre as economias do mundo sem recorrer à corrida armamentista ou nuclear, e no mesmo momento em que os EUA e o Papa se reaproximam de Cuba, esse eco do passado no Brasil faz até barulho, mas não consegue apoio da maioria das elites socioeconômicas e soa anacrônico.

Em que pese o quadro acirrado, Juscelino foi eleito Presidente em outubro de 1955. Foram cerca de 3 milhões de votos (35,7% dos votos válidos). Naquele momento, não havia segundo turno no Brasil, assim como não havia reeleição. Juarez Távora teve 2,6 milhões de votos (30,2%); Ademar de Barros, 2,2 milhões (25,8%) e Plínio Salgado, 0,7 milhões (8,3%). JK – considerado um dos três melhores presidentes do País (ao lado de Getúlio Vargas e Luís Inácio Lula da Silva) – paradoxalmente, obteve a menor votação entre os presidentes eleitos desde a segunda guerra. Dilma, por sua vez, foi reeleita em segundo turno em um país também bastante dividido: obteve 54,1 milhões de votos (51,6%) contra 51 milhões (48,4%) de Aécio Neves.

JK ganhou as eleições em outubro de 1955, mas quase não levou. A oposição, liderada por Carlos Lacerda, da UDN, tentou anular a eleição. A alegação era de que a chapa de JK não havia alcançado a maioria absoluta (50% mais um). Ao final de 2014, Dilma foi reeleita nas urnas. Houve também a tentativa de se anular a eleição. Hoje, não querem deixar que ela exerça o mandato para o qual foi eleita democraticamente. Recentemente, o PSDB – cujo candidato concorreu ao segundo turno com Dilma - encerrou auditoria própria concluindo ser impossível afirmar que houve fraude naquela eleição. Nem por isso desistem de derrubar a Presidenta eleita. O candidato derrotado, senador Aécio Neves, , assumiu o papel de Carlos Lacerda contemporâneo. Em realidade, fazendo justiça a Lacerda, seu pretenso sucessor possui muito menos brilho e faz triste figura ao lado do patrono.

Por ironia da história, a posse de JK só ocorreu em função do impeachment do presidente interino Carlos Luz (que, como Presidente da Câmara dos Deputados, havia assumido, em novembro de 1955, no lugar o lugar de Café Filho, que teve problemas de saúde). O impeachment foi provocado por um levante militar realizado por aliados do General Lott. Este levante, que se deu ainda em novembro de 1955, também defendia que os candidatos eleitos fossem empossados. O Estado de sítio vigorou no Brasil até que a posse de JK se efetivasse, o que se deu em 31 de janeiro de 1956.

Sair da agenda negativa imposta pelo Congresso da época foi uma das virtudes do Governo JK. Do ambiente sombrio, passamos para o Brasil do otimismo e do desenvolvimento acelerado (os "anos dourados").O Plano de Metas (31 metas) prometia “50 anos em 5”. E o Brasil cresceu próximo disso: construção de uma nova capital (Brasília); industrialização acelerada, com a estruturação de novos segmentos da pirâmide industrial brasileira, como a indústria de bens de consumo duráveis (automobilística e eletroeletrônica); pesados investimentos estrangeiros, especialmente das multinacionais; expansão do consumo em paralelo à difusão do “american way of life”; elevada geração de empregos. O otimismo era transmitido pela TV que acabava de chegar, pelo rádio, pelo cinema novo, pela bossa nova.

E fez tudo isto, não sem críticas e acusações várias. O déficits orçamentários e a escalada inflacionária expandiram-se, sem dúvida, durante o seu governo. Mas não tenhamos dúvida: em meados da década de 1950, sem ter o Brasil construído ainda um sistema financeiro capaz de viabilizar os grandes investimentos com financiamentos de longo prazo, o Brasil não conseguiria dar o salto de industrialização que deu sem o volume maciço de gastos públicos realizados. Encurralada pela popularidade de JK, restou à oposição acusar (como aconteceu no início de 1959) o governo de superfaturamento nas obras, o que nunca foi comprovado. Da mesma forma, inexiste hoje qualquer acusação efetiva contra a Presidente Dilma por crime de responsabilidade, como afirmam os juristas Celso Bandeira de Mello, Fabio Comparato, Dalmo Dallari, André Ramos Tavares e Gilberto Bercovici, além do ex-ministro do STF Carlos Ayres Brito. Todos esses juristas refutam a possibilidade de se admitir sequer a abertura de processo de impeachment, por falta de fundamentação jurídica.

O Brasil precisa retomar o desenvolvimento, readquirido nas Gestões do Presidente Lula (2003-2010), após o longo domínio de políticas neoliberais do período FHC (1994-2002). Isto somente ocorrerá se, semelhantemente a JK, a Presidente Dilma recolocar na ordem do dia uma agenda positiva de crescimento, que traga o otimismo e unidade mínima entre as várias frações da sociedade brasileira.

Jefferson José da Conceição é Prof. Dr. da USCS.

 Roberto Vital Anav é Doutorando da UFABC e Prof. da USCS

*Artigo publicado, em 26/10/2015, no site do ABCDMaior (www.abcdmaior.com.br), na seção "Blogs".

#JuscelinoKubitshchek#JK#desenvolvimentismo

sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Dois modelos econômicos em disputa nestas eleições


23/10/2014 - ARTIGO
 
Por: Jefferson José da Conceição*

 

http://www.abcdmaior.com.br/imagens/upload/noticias/62569.jpg
Um é desenvolvimentista, outro é rentista

São dois modelos em disputa neste segundo turno. O primeiro modelo, de linha desenvolvimentista, é o que está em curso nos últimos doze anos, com os Governos de Lula e Dilma. Este modelo equilibra as prioridades entre crescimento econômico e estabilização da inflação. Ele se assenta nos seguintes elementos: 1) forte expansão do mercado interno, com base na Política de Valorização do Salário Mínimo; no incremento dos aumentos reais das diversas categorias profissionais; no Bolsa Família; nas Políticas Ativas de Geração de Empregos (20 milhões gerados) e; no Incremento do Crédito; 2) retomada, desde 2004, de uma Política Industrial, Científica e Tecnológica, com os programa como o PITCE, PDP, Plano Brasil Maior – inserindo na construção da política industrial o poder público, o setor produtivo, as universidades e os sindicatos; 3) diálogo com o setor produtivo, por meio de espaços como o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, os Arranjos Produtivos Locais (APLs) e a “abertura de portas” para diálogo direto com Ministérios, BNDES, FINEP, ABDI e Bancos Públicos; 4) políticas de enfrentamento às crises internacionais de natureza anticíclica, por meio da elevação do crédito dos bancos públicos, redução dos impostos sobre consumo e aumento do gasto público. As metas de superávit fiscal, taxas máximas de inflação e flutuação do câmbio são parte deste modelo, mas flexibilizadas sempre que isto ameace afetar em demasia o nível de atividade e o emprego.
O segundo modelo tem característica monetarista e prioriza a estabilização monetária. Ele foi aplicado entre 1994 e 2002, quando o PSDB, de FHC/Aécio Neves, esteve no comando da economia nacional. Esse modelo combinou: 1) juros muito altos, câmbio supervalorizado (até 1998) e redução das tarifas de importação (de maneira acelerada, linear, não seletiva e sem negociar contrapartidas); 2) forte aumento da carga tributária para compensar a dívida pública em um contexto de retração econômica; 3) estímulo federal à guerra fiscal entre Estados e Municípios; 4) financiamentos do BNDES a Consórcios Internacionais nos leilões de privatizações de estatais e escassez de Financiamento a grupos nacionais; 5) reação às crises internacionais, por meio de redução dos gastos públicos e de políticas monetárias restritivas, com base em aumento de Juros e retração do crédito. Como consequência desse conjunto de medidas do segundo modelo, verificou-se o fechamento centenas de empresas, desnacionalização, perda de domínio tecnológico e eliminação de milhares postos de trabalho cortados na Indústria brasileira (81 mil postos ceifados somente na Região do Grande ABC, apenas para dar o exemplo da região do ABC). Neste segundo modelo, as metas de superávit fiscal, taxas máximas de inflação e flutuação do câmbio são tomadas como inflexíveis, mesmo que isto signifique forte comprometimento do nível de atividade.
Sou defensor do primeiro modelo, pois o segundo traz sérios riscos para o Brasil. Os principais riscos, no campo econômico, são: a) retorno da preponderância do capital financeiro nas decisões governamentais, e consequente perda de espaço do capital produtivo; b) redução do papel da Política Industrial e das Políticas Setoriais, por meio da eliminação de subsídios e isenções (a exemplo do Inovar Auto) e da redução do crédito produtivo orientado; c) atuação do BNDES e dos bancos públicos mais próxima à de um banco comercial (isto é, com lógica exclusiva da geração de lucros para o banco); Redução dos bancos públicos; d) políticas monetárias mais austeras, conduzidas com maior autonomia pelo Banco Central; e) retração quantitativa e maior seletividade do crédito; f) eliminação das Políticas de Valorização do Salário Mínimo, com rebatimento na queda do Poder de Compra e do Mercado Interno de Consumo; g) eliminação de fóruns de diálogo e dos espaços tripartites (a lógica econômica passa a ser orientada pelo mercado).
Ajustes no primeiro modelo são necessários, é claro. No próximo mandato, é fundamental: 1) fortalecer a política industrial, com maior grau de participação da produção local em projetos estruturantes como os do Pré-Sal, Mobilidade Urbana, Saúde, Defesa, entre outros; 2) implementar políticas inovadoras em elaboração, neste momento, pelo governo , como é o caso do MODERMAQ, PRÓ-FERRAMENTARIA e INOVAPEÇAS; 3) tornar efetivas as políticas de incentivo ao adensamento da base industrial de defesa, como é o caso do INOVADEFESA e do RETID; 4) encontrar soluções para problemas reais do setor produtivo, como o acesso ao crédito público que é impedido pela ausência de regularizações documentais das empresas (como é o caso da Certidões negativas de débito); 5) aprofundar a desoneração para os investimentos produtivos e os incentivos à desoneração da folha de pagamentos; 6) implementar efetivamente a política de Simplificação Tributária, sem que isto signifique o desincentivo ao crescimento das empresas; 6) manter e aprofundar o diálogo do setor produtivo com o Governo Federal.
*Jefferson José da Conceição é secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo de São Bernardo do Campo e professor doutor da Universidade Municipal de São Caetano do Sul, responsável pela disciplina de Economia Brasileira Contemporânea.

segunda-feira, 19 de outubro de 2015

"BABY BOOMERS” E ESTAGIO SENIOR

 Jefferson José da Conceição

Os nascidos entre 1945 e 1965 são chamados em inglês de “baby boomers”. Foi grande o número de bebês gerados após a Segunda Guerra. A volta dos soldados para casa e a reação sexual à hostilidade da guerra são as justificativas para a explosão populacional. Hoje, aqueles “bebês” começam a chegar aos 60 anos. No mundo, a população com mais de 60 anos é crescente. Segundo a OMS, eles são mais de 900 milhões de pessoas em 2015, ou 12,3% do total. Deverão chegar a 21,5% em 2050. No Brasil, hoje, eles são 23 milhões (12,5%) e deverão chegar a 64 milhões em 2050 (30%). É o resultado do aumento da expectativa de vida e da redução da natalidade..

Isto traz uma série de desafios na saúde, finanças, políticas públicas, Previdência etc. Vou me ater ao tema do trabalho. Muitas pessoas viverão mais tempo em aposentadoria do que no seu período laboral ativo. É, pois, essencial uma Política de preparação para a aposentadoria (Pré-Aposentadoria), com orientações diversas em saúde preventiva, atividade física, nutrição, educação financeira, informações sobre programas sociais e de lazer, bem como sobre projeto de vida. Nós, do SBCPrev, Instituto de Previdência de São Bernardo, em parceria com a Prefeitura, estamos estruturando esse Plano para os servidores prestes a se aposentar. Iniciaremos sua execução em dezembro.

A sociedade não deve tratar os aposentados como ultrapassados. Isto só tende a agravar sua natural depressão. Neste sentido, é bastante oportuna a temática do filme “Um senhor Estagiário” (The Intern), estrelado por Robert De Niro e Anne Hathaway. No filme, Ben (De Niro) é um aposentado de 70 anos que verifica que a aposentadoria é muito diferente do que tinha imaginado. Ele então decide tomar parte de um programa social da empresa de site de moda administrada por Jules (Hathaway). Ben torna-se um “estagiário sênior”.

A legislação brasileira não tem regras de apoio ao momento de passagem da vida laboral ativa para a aposentadoria. Muitos trabalhadores aposentados continuam trabalhando na empresa para manter sua renda. Há legislações previdenciárias específicas sobre isto, mas não há uma política de saída gradual e planejada da vida ativa da empresa. Também não há um programa de incentivo à contratação de idosos.

O artigo 28 do Estatuto do Idoso (Lei 10741/2003) diz que: “O Poder Público criará e estimulará programas de: I profissionalização especializada para os idosos, aproveitando seus potenciais e habilidades para atividades regulares e remuneradas; II preparação dos trabalhadores para a aposentadoria, com antecedência mínima de 1 ano (...); III estímulo às empresas privadas para admissão de idosos ao trabalho”. Mas estes itens ainda não são uma realidade concreta e difundida no Brasil.

A Lei do Estágio (Lei nº 11.788/2008), em seu artigo 1º, conceitua “Estágio [como] ato educativo escolar supervisionado, desenvolvido no ambiente de trabalho, que visa à preparação para o trabalho produtivo de educandos que estejam frequentando o ensino regular (...)”. Entretanto, uma possibilidade é admitir que, com jornada menor e dentro de uma cota, a empresa contrate aposentados idosos como estagiários para que estes repassem conhecimento para os mais jovens. Esta proposta de legislação deve ser bem elaborada e discutida para evitar a precarização do trabalho.

Jefferson José da Conceição é Diretor Superintendente do SBCPrev.

Artigo publicado na seção Blogs do site do ABCDMaior, em 19/10/2015.

#aposentadoria#preaposentadoria#previdência#estagiosenior

sexta-feira, 16 de outubro de 2015

"QUANDO OUTROS PERSONAGENS ENTRAM EM CENA": CDES, CAMARAS SETORIAIS, APLs...


Jefferson José da Conceição

A saída da crise ocorrerá por meio do diálogo. Políticas monetárias e fiscais clássicas são necessárias, mas não suficientes. O incremento da arrecadação e a redução de gastos são requeridos para organizar as finanças públicas - isto, desde que na dosagem certa e com seletividade social. Mas as crises em uma economia historicamente complexa como a brasileira exigem saídas inovadoras, heterodoxas. Mais: é fundamental que a sociedade vislumbre perspectivas em relação ao futuro, mesmo diante de um presente instável. Foi assim nas décadas de 1930, 1960, 1970, 1980 e 1990.

De maneira tópica, tenho apontado itens do que seria uma pauta a seguir. Hoje tratarei de um importante canal para a construção de soluções: a extensão e aprofundamento do diálogo social para além mesmo dos palcos tradicionais como o Congresso Nacional. Espaços multipartites como o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República (CDES), os Fóruns Temáticos Tripartites e as Câmaras Setoriais deveriam ser retomados para a edificação de uma agenda positiva.

Não é simples a tarefa de promover o diálogo. O Congresso é hoje a antítese do consenso e da negociação. A oposição adotou o “quanto pior, melhor”. Por sua vez, a base aliada é frágil. A ausência do diálogo impede o surgimento de uma agenda positiva no parlamento. O quadro é dificultado pela judicialização da política e pela parcialidade com que têm agido frações do Judiciário. O atrelamento rígido do Ministro da Fazenda aos princípios monetaristas e liberais também não facilita o cenário. O enfraquecimento do diálogo com os diversos “personagens” da sociedade brasileira é um dos pontos de vulnerabilidade do Governo Dilma, especialmente quando comparado com o que se verificou nas gestões do Presidente Lula.

Além da construção de diagnósticos comuns, políticas públicas acordadas e compromissos com metas, os espaços multipartites caracterizam-se também por agregar outros “personagens” na construção da agenda: sindicatos, associações empresariais, universidades, Igreja entre outras. São novas formas de "governance", como se diz na literatura econômica. Outros espaços e personagens podem ajudar o País a sair deste labirinto.

No campo da Política Industrial, as Câmaras Setoriais e os Arranjos Produtivos Locais (APLs) são espaços que já mostraram sua capacidade de mobilização e competitividade. Um comentário à parte: destaco sempre aos meus alunos o caráter inovador que JK deu à sua política industrial ao constituir os Grupos Executivos por setor, como o GEIA na indústria automobilística. Estes Grupos ajudaram a detalhar o Plano de Metas setorialmente.

Estruturadas as Câmaras Setoriais, o Governo deveria deixar claro que, ao invés delas focarem na redução tributária como aconteceu nos anos de 1990, dois itens passariam a ser centrais na pauta: o incremento das exportações e a substituição de importações. Estes pontos unificariam os interesses de governo, empresários e sindicatos. No âmbito dos territórios e regiões, os bem-sucedidos APLs poderiam contribuir para aprofundar e detalhar esta agenda nacional prioritária.

Em tempo: inspirei-me no título do clássico trabalho de Eder Sader, sobre o movimento social na Grande SP dos anos de 1970, para dar o título deste artigo.

Jefferson Conceição é Diretor Superintendente do SBCPrev e Prof. Dr. da USCS.

Artigo publicado no jornal ABCDMaior, de 16/10/2015.

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

A Cidade Desenvolvimentista: crescimento e diálogo social em São Bernardo do Campo, 2009-2015.


CONCEIÇÃO, Jefferson José da; KLINK, Jeroen Johannes; OLIVEIRA, Nilza Aparecida de; ANAV, Roberto Vital. A Cidade Desenvolvimentista: crescimento e diálogo social em São Bernardo do Campo, 2009-2015. São Paulo: Perseu Abramo, 2015.


O livro está disponível em:

http://www.4shared.com/office/CHNXtRkBba/A-cidade-desenvolvimentista-ok.html

ou em:

http://www.fpabramo.org.br/publicacoesfpa/?page_id=477



quarta-feira, 7 de outubro de 2015

NEM PATO, NEM “FOIE GRAS”: O QUE A FIESP NÃO DIZ EM SUA SUPOSTA LUTA CONTRA OS IMPOSTOS


Jefferson José da Conceição

Na crise, é atraente a mobilização contra o aumento dos impostos e a favor do corte das despesas e desperdícios do Governo. Mas é preciso estar atento às contradições dos discursos fáceis. É o caso da campanha “Não vou pagar o pato”, que a Fiesp acaba de lançar. Um manifesto colhe assinaturas contra o aumento dos impostos e a volta da CPMF, prevista no ajuste fiscal do Governo. Em 1º de outubro um pato gigante de 12 m foi erguido em Brasília.

A entidade busca repetir a cruzada que fez em 2007 pelo fim da CPMF. O tributo foi extinto pelo Congresso no final daquele ano. Hoje, a Fiesp não reconhece que parte dos problemas da Saúde, nos últimos anos, deriva do fim da CPMF (arrecadação estimada em R$ 38 bilhões ao ano).

Em 2013, a Fiesp foi contra o projeto do IPTU progressivo, do Prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, que elevaria os impostos dos distritos mais ricos e reduziria os dos mais pobres. No final, a entidade conseguiu que o STF (Ministro Joaquim Barbosa) mantivesse liminar suspendendo o projeto. A entidade barrou o que seria uma política tributária municipal socialmente mais justa.

No referido manifesto, a FIESP não faz qualquer referencia ao fato de que parte do excesso de despesas do governo se deve ao elevado volume de desonerações tributárias concedidas desde 2011. De acordo com Estudo da Receita Federal (RF), as desonerações somarão uma “perda” de R$ 458 bilhões em 2018, se todos os incentivos continuassem valendo até lá. A RF contabilizou medidas como a prorrogação da desoneração do IPI sobre bens de capital, materiais de construção e caminhões; as novas faixas do Simples Nacional e a correção da Tabela do IR (2011); a desoneração da folha de pagamentos; a redução do IOF sobre crédito de pessoa física; a diminuição das alíquotas do Cide sobre a gasolina e diesel (2012); a desoneração da cesta básica; a prorrogação da desoneração de IPI sobre automóveis; a diminuição das alíquotas de PIS/Cofins para a indústria química (2013), entre outras.

É possível questionar à RF se este montante de R$ 458 bi ocorreria realmente, se não tivessem as desonerações. Mas é certo que houve mesmo um exagero nas concessões. E também foram frágeis as exigências de contrapartidas impostas às empresas e setores beneficiados. Sou favorável às políticas industriais que utilizam incentivos fiscais para promover o desenvolvimento, mas as medidas precisam ser na dosagem certa. As desonerações recentes contribuíram para os desequilíbrios fiscais. Não há uma única linha no manifesto sobre isto.

A Fiesp também não menciona que parte de sua estrutura é mantida com base em arrecadações parafiscais, como a do “Sistema S” (2,5% obrigatórios sobre cada folha de salários) e as contribuições sindicais cobradas sobre as empresas por lei. Claro, neste caso o pato transforma-se em um saboroso “foie gras” – nobre prato francês feito com o fígado do pato e em geral acessível apenas às pessoas mais ricas.

O Brasil precisa de uma Reforma Tributária que promova a justiça social, dê condições de investimento ao Estado e incentive a produção e o emprego. Ela deveria privilegiar maior tributação sobre a renda e propriedade, e menor sobre o consumo. Investimentos produtivos e famílias mais pobres deveriam ser desonerados. O capital financeiro e as famílias mais ricas pagariam mais impostos.

Jefferson José da Conceição é Prof. da USCS.
*Artigo publicado no ABCDMaior em 7/10/2015

#fiesp#impostos#cargatributaria#reformatributaria