Jefferson José da Conceição
Prof.Dr.da USCS
Maria da Consolação Vegi
Advogada e Coordenadora do Depto. Jurídico
do Sindicato dos Bancários do ABC
Há inúmeros aspectos a serem
analisados sobre a Reforma Trabalhista aprovada pelo Congresso brasileiro em julho,
sancionada pela Presidência da República no mesmo mês e que deverá entrar em
vigor em novembro deste ano de 2017. Neste artigo, pretendemos, sinteticamente:
1) resgatar o contexto mais amplo
em que se insere a reforma trabalhista;
2) apresentar uma síntese das
principais mudanças impostas pela reforma;
3) apontar, de maneira tópica, algumas
das tendências possíveis após a aprovação da reforma.
1 O contexto mais amplo da
Reforma Trabalhista
1.1 A “modernização conservadora”
O rompimento com a Era Vargas vem
sendo recorrentemente almejado desde a década de 1990, com a abertura da
economia brasileira e a inserção do País no processo de globalização. A
legislação trabalhista, transcrita na “Consolidação das Leis do Trabalho”, é um
dos legados desta Era. Nela, a organização do trabalho e da produção foi
acompanhada de direitos como salário mínimo, piso salarial, jornada máxima,
direito ao descanso remunerado, impedimentos à demissão e previdência social. Buscava-se
constituir as bases do processo de transição de uma economia agrária, baseada
na monocultura do café e centrada na fazenda como espaço da produção, para uma
economia industrial diversificada, que passava a ter a fábrica como local por
excelência da acumulação capitalista no Brasil.
Também são herança do período
getulista a estruturação das organizações corporativas de diversas instituições
que fazem parte das relações entre capital e trabalho, como os sindicatos de
trabalhadores e as instituições representativas do empresariado (como a CNI, a
FIESP, a FIRJAN entre outras), o imposto sindical obrigatório, a Justiça do
Trabalho e o sistema “S”. Isto, ao lado, da estatização de setores estratégicos
e do peso do Estado na regulação, indução e fomento da atividade econômica. Positiva
ou negativamente – e neste ponto haverá sempre um juízo de valor em qualquer
avaliação que se faça -, este legado, com todas as suas contradições, teve sua
funcionalidade no complexo e contraditório processo de “desenvolvimento” tardio
do Brasil.
Os autores deste artigo fazem
parte dos setores progressistas que nos últimos anos têm defendido que deveríamos
partir deste legado e construir uma nova estrutura na legislação trabalhista,
bem como das demais instituições da Era Vargas. Aqui, cabe inclusive registrar
uma espécie de “mea culpa”, por parte
de todos nós que compomos os segmentos mais identificados com a luta pelo
progresso social, quando, de certa forma, “aceitamos” (porque foram reduzidas
as críticas) que fossem gradativamente interrompidas as discussões e as negociações feitas no Fórum Nacional do
Trabalho, ainda na primeira gestão do Governo Lula, em troca de uma
governabilidade que envolveu acordo tácito com segmentos que não queriam
realizar mudanças na legislação trabalhista e na organização sindical. Como
resultado, no campo das relações de trabalho, restaram, naquele momento, apenas
as boas notícias relacionadas aos expressivos números de expansão dos empregos.
A reforma e os avanços na legislação trabalhista viriam supostamente em um
segundo momento.
Alinhamo-nos entre aqueles que
acreditam que é preciso atualizar as leis trabalhistas aos novos tempos deste
século XXI, de novos processos organizacionais das empresas, tecnologias, hábitos
culturais, modo de vida e anseios. Entretanto, entendemos que, em um país tão
desigual como o Brasil, é condição indispensável que a nova legislação represente
também avanços sociais – e que estes avanços sejam o resultado de pactos
sociais civilizatórios acordados entre as partes organizadas de nossa
sociedade.
O que presenciamos neste momento
é, porém, diametralmente o oposto. As amplas mudanças implementadas na
legislação trabalhista promovidas pelo Governo Temer, com o aval do Congresso,
são um retrocesso, uma volta ao passado – em alguns casos, anterior à mesmo à Vargas1. Como se verá na segunda seção deste artigo, as
mudanças trazem novamente a desproteção, o trabalho precário e a insegurança.
Trata-se de uma “modernização conservadora”.
Uma “modernização conservadora”
desta natureza somente consegue ser aprovada por meio de um processo político
de ruptura institucional, em que as forças políticas e econômicas do conjunto
das elites dominantes se sobrepõem sem muita resistência das parcelas
majoritárias da sociedade. Entendemos que é isto o que se verificou no caso da
Reforma Trabalhista. Esta ruptura é apoiada pelo empresariado, pela maioria do
Congresso Nacional, pelos grandes meios de comunicação e por parte de um
judiciário que procura garantir “legalidade” aos atos discricionários em curso.
Sobre o judiciário, vale constar que, em entrevista
ao Valor Econômico, em 29/9/2017, Gilmar Mendes, o conservador Ministro
do Supremo Tribunal Federal, disse: “não
acredito que vá haver resistência sistemática (do Judiciário) à aplicação da
nova legislação trabalhista. Se houver, vai haver recurso institucional do STF.
Essa reforma é quase uma revolução cultural. Estamos cingindo nossos vínculos
com a Era Vargas”.
É neste contexto de pleno domínio
das forças conservadoras que se compreende a esdrúxula (porque inicialmente o
projeto enviado pelo Executivo alteraria apenas seis artigos da CLT e finalizou
modificando mais de cem pontos) e veloz tramitação do projeto de reforma no
Congresso (sem nenhuma alteração do senado!), bem como a inusitada “promessa”
do governo de que, “após aprovada a reforma”, editaria uma medida provisória
com ajustes no texto antes mesmo da reforma trabalhista entrar em vigor. Tudo
isto caracterizando um processo de aprovação “à fórceps”, marcado pela ausência
de tempo para um debate prévio com a sociedade – debate este que seria fundamental
para a aprovação democrática de uma reforma desta magnitude2.
O claro autoritarismo do processo
se soma ao otimismo das elites com os resultados do novo ambiente institucional,
o que fica claro, por exemplo, em uma declaração de Persio Arida, ex-presidente
do Banco Central e ex-sócio do BTG Pactual, ao Valor Econômico de 25/8/2017: “Ninguém acreditava na aprovação de medidas
como a reforma trabalhista e o teto [dos gastos públicos]”. Mas Arida não
associa explicitamente esta animadora surpresa a qualquer ruptura institucional
e sim a uma mudança na “mentalidade” dos países latino-americanos nos anos
recentes em direção a uma agenda liberal.
Neste contexto, não é estranho
que mesmo os empregadores, que são os beneficiários diretos da reforma,
desconheçam as novas medidas, como mostra pesquisa do Sindicato da Micro e
Pequena Indústria de São Paulo (Simpi) realizada em julho: apenas 15% das micro
e pequenas empresas do Estado de São Paulo estão bem informadas sobre a nova
lei, ao passo que 29% dizem desconhecer o conteúdo da reforma.
Outra manifestação do
conservadorismo desta modernização é o fato de que, ao contrário do que
acontece com as normas que regem a legislação trabalhista, o imposto sindical e
o papel da Justiça do Trabalho, o Sistema “S”, outro elemento da Era Vargas,
não sofreu qualquer alteração. Como se sabe, o Sistema “S” representa a estrutura
formada pelo Senai, Sebrae, Sesc, Senac, Sest, Senat, Sescoop. O sistema “S” arrecada,
compulsoriamente, para seu funcionamento, mais de R$ 20 bilhões por ano de
trabalhadores e empresas, por meio de cobrança obrigatória de 2,5% sobre cada
folha de salários no País. Isto, sem que haja maior transparência na prestação
das suas contas e sem que haja o envolvimento, em sua gestão, de outras
instituições que poderiam estar diretamente ligadas ao sistema, como os
sindicatos de trabalhadores e as universidades. Hoje, cabe às instituições como
CNI e FIESP a gestão do sistema – não sem coincidência as mesmas que estiveram
a frente do processo de impeachment da Presidente da República.
1.2 Reforma trabalhista: a semelhança com 1964 e o peso do mercado
financeiro
Neste sentido, os anos de 2016 e
2017, de reformas do Governo Temer, assemelham-se muito mais ao período pós
1964. Tanto em 2016/2017 quanto em 1964 o pacto das elites conservadoras
traduziu-se em transformações rápidas das “regras do jogo” nas relações de
trabalho. Assim, a nova legislação trabalhista aprovada em 2017 traz mudanças
cujo impacto lembram as transformações trazidas pelos Governos militares da
Revolução de 1964. Na década de sessenta, os governos ditatoriais, em um
ambiente autoritário e com o apoio do empresariado, substituíram a estabilidade
decenal pelo Fundo de Garantia por Tempo de Serviço. Isto, combinado com a
política de arrocho salarial, e a um conjunto de outras reformas executadas
(fiscal, bancária, etc), possibilitou a constituição de um modelo de
crescimento econômico fortemente excludente – que se refletiu na piora dos
indicadores de desigualdade e exclusão, em que pese a expansão do emprego.
A reforma que estabeleceu um
“teto” nos gastos públicos por vinte anos (PEC 241) impede, a nosso ver, que se
criem expectativas de crescimento econômico a taxas muito elevadas, como
aconteceu no chamado “milagre econômico brasileiro” (1968-1973). Mas não é
descabido pensar que a partir de 2018 o crescimento econômico seja retomado
(possibilidade de expansão dos investimentos estrangeiros associado à
desnacionalização e privatização da economia brasileira, por exemplo).
Entretanto, no cenário de continuidade das novas regras do jogo, impostas pela
reforma trabalhista, o modelo de crescimento certamente seria excludente, tal
qual o verificado no início dos anos de 1970.
Registre-se por fim que o mercado
financeiro, que nas últimas décadas teve grande peso nas decisões políticas e
econômicas do país, ampliou significativamente seu grau de influência durante e
após o impeachment da Presidente
Dilma. Nossa hipótese é de que são grandes, e até mesmo decisivos, os
interesses dos bancos no caso da reforma trabalhista.
Um primeiro interesse é direto: a
nova legislação trabalhista aprovada, que eleva os riscos e os custos das ações
trabalhistas para os empregados e traz maiores dificuldades para se conseguir
equiparação salarial (Plano de Cargos e Salários, por exemplo), permitirá que,
além da redução com a folha de pagamentos corrente (em função das novas
modalidades de contratação e do provável incremento da terceirização), os
bancos tenham uma redução na conta das condenações que têm tido que pagar nos
últimos anos no âmbito dos tribunais do trabalho. Neste sentido, matéria do
Valor Econômico, de 4/9/2017, mostrou que, entre 2008 e 2016, somente os bancos
Itaú, Santander, Banco do Brasil, Bradesco e Caixa Econômica Federal tiveram
condenações trabalhistas da ordem de R$ 35 bilhões. Estes bancos estão entre as
dez empresas mais acionadas no Tribunal Superior do Trabalho.
O segundo interesse é menos
evidente. O ponto de partida é entender a lógica que move o apoio do mercado
financeiro à medida que garante o controle dos gastos públicos nos próximos
vinte anos. Este apoio ocorre, sobretudo, porque o sistema financeiro é
beneficiário direto da medida: a contenção dos gastos e a geração de superávit
fiscal permite a continuidade do pagamento dos juros da dívida pública – da
qual os bancos são os maiores credores. Os bancos sabem, contudo, que tal
medida tem como consequência o aumento do desemprego e redução do mercado
interno. Consequentemente, neste cenário, maiores serão as dificuldades de
valorização das demais frações do capital (indústria, comércio, serviços,
agricultura). Logo, é essencial garantir meios de aumentar minimamente a
valorização geral de todos os capitais. É neste momento que a redução do custo
do fator trabalho entra como variável de ajuste, beneficiando a todos os
capitais.
Assim, os bancos passaram a apresentar
estudos “técnicos” defendendo a reforma trabalhista. Por exemplo, matéria do
Valor Econômico, de 8/8/2017, revela que o Itaú divulgou estudo por ele
contratado e que mostra que a reforma trabalhista deverá fazer o país
“disparar” no ranking de eficiência
do mercado de trabalho do Relatório de Competitividade Global do Fórum
Econômico Mundial (passando da 117ª posição em um ranking de 138 países para a 86ª posição). Segundo o mesmo estudo,
a reforma poderá também aumentar em 3,2% o PIB per capita num período de quatro
anos e reduzir a taxa de desemprego em 1,4% ponto percentual, o equivalente a
1,5 milhão de empregos.
Por fim, cabe destacar que este
circuito circunscrito de relações entre o Governo e as elites dominantes ficou
bem definido nos discursos do Presidente Temer e do Ministro da Fazenda
Henrique Meirelles, feitos em 13/7/2017, no ato em que o presidente sancionou a
nova legislação trabalhista. De acordo com Temer: “Trata-se de uma ‘suposta crise’ [criada por certos segmentos da
sociedade], porque o que realmente acontece em [meu] entorno é um ‘entusiasmo
extraodinário’. (...) O projeto [da reforma trabalhista] é a síntese de como
este governo age, por meio do diálogo (...). Desde o início do meu mandato,
assumi o compromisso de levar adiante as reformas (...). São 14 meses que estão
modernizando o país. Combater o desemprego é voltar-se para o social; para
tanto, é preciso prestigiar a iniciativa privada”. No mesmo evento,
Meirelles completou: “Temos reformas de
todos os níveis e todas as áreas”.
2 Síntese da Reforma Trabalhista
A Reforma Trabalhista (Lei nº
13.467/2017) aprovada no Congresso Nacional trata de diversos pontos
relacionados ao mundo do trabalho: desde a normatização das relações
individuais, coletivas e sindicais, até as questões referentes aos aspectos
processuais (Justiça do Trabalho, tramitação de processos, etc). Sem a
pretensão de esgotar a reforma, apresentamos a seguir uma síntese daquilo que
nos parece mais essencial.
2.1
Inversão da hierarquia das normas: autonomia da vontade coletiva e individual e
intervenção mínima do Estado
Há inúmeros artigos da reforma que
indicam a clara intenção em se privilegiar a autonomia da vontade coletiva e
individual em detrimento às normas estabelecidas pelo Estado.
Podemos afirmar que, de certo modo, a
Reforma Trabalhista inverteu a hierarquia das normas, ainda que tenha deixado a
Constituição Federal e os princípios do Direito do Trabalho no vértice da
pirâmide. Os acordos coletivos prevalecem, de forma ampla, sobre a lei
ordinária. Sob algumas condições, os acordos individuais também prevalecem
sobre a lei.
Além disso, o parágrafo 1º do artigo
611-A, inserido pela Reforma, prevê que a Justiça do Trabalho não poderá
analisar o mérito. A Justiça pode apenas decidir sobre os requisitos formais,
como a legitimidade das partes, a forma e a licitude do objeto do acordo.
2.2
Do que é permitido a partir da autonomia coletiva
O artigo 611-A, inserido pela lei da
Reforma, traz um rol exemplificativo de matérias que poderão ser objeto de
negociação coletiva. Entre elas:
a)
Jornada de trabalho (banco de horas, jornada 12 x 36,
intervalo intrajornada, registro de jornada, prorrogação de jornada em local
insalubre e sobreaviso);
b)
Plano de cargos e salários;
c)
Regulamento de empresa;
d)
Troca de feriados;
e)
Remuneração por produtividade, gorjetas, prêmios e Participação
nos Lucros e Resultados (PLR);
f)
Teletrabalho e trabalho intermitente;
g)
Grau de insalubridade;
h)
Representação de empregados no local de trabalho;
i)
Adesão ao Programa Seguro-Emprego (PSE).
A reforma prevê também que os Planos de
Demissão Voluntária (PDV) negociados com o sindicato implicarão na quitação do
contrato de trabalho do empregado, impossibilitando-o de ingressar com ações
judiciais para pleitear outros direitos. Esta alteração vai ao encontro da
recente decisão do STF sobre essa matéria (RE 590415).
Cabe ressalvar, porém, que, se alguma
norma coletiva reduzir salário ou jornada, os empregados não poderão sofrer
dispensas imotivadas. Mais: se algum trabalhador ingressar com ação trabalhista
pedindo a nulidade da norma coletiva, o Sindicato deverá ser chamado a
participar como réu na ação (denomina-se tecnicamente de “litisconsórcio
necessário”).
A discussão que se trava neste aspecto
é se a norma coletiva poderá se sobrepor a lei em prejuízo ao trabalhador.
Neste caso, deve-se levar em
consideração que o artigo 611-B, também inserido pela Reforma, menciona que,
“exclusivamente” em relação aos direitos ali listados, não poderá ocorrer a
supressão ou redução. Logo, conclui-se que, em relação aos demais direitos que
não estão no rol do artigo 611-B, poderia haver supressão ou redução.
Apesar disso, quando se consideram os
princípios norteadores do Direito Social do Trabalho - como o da aplicação da
norma mais favorável, da proteção ao trabalhador e o da vedação do retrocesso
social, extraídos do caput do artigo 7º, da CF3 - haverá de se
concluir que a norma coletiva não poderá estabelecer condições inferiores à
lei.
A reforma também estabelece que as
normas coletivas terão vigência de no máximo dois anos. Ao final da vigência,
se não forem renovadas, perdem a validade. Neste caso, a reforma ignorou
completamente a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho. O Tribunal já havia
editado a Súmula 277 que garantia a ultratividade das normas coletivas,
fundamentada no §2º, do artigo 114 da CF e o artigo 468 da CLT. Isto é, a norma
coletiva incorpora o contrato de trabalho, mantendo a sua validade mesmo após a
vigência da norma coletiva.
Outro ponto polêmico da reforma é a
prevalência do acordo coletivo sobre a convenção coletiva, mesmo que o acordo fixe
direitos inferiores à convenção coletiva, invertendo a lógica existente até o
momento. Aqui cabe lembrar que o acordo coletivo é aquele firmado entre um
sindicato e uma empresa ou grupo de empresas. A convenção coletiva é o acordo
firmado entre um sindicato de empregados e outros sindicatos de empresas, ou
seja, a sua abrangência é maior.
2.3
Do que é permitido a partir da autonomia individual
A Reforma inseriu parágrafo único no
artigo 444 da CLT, mencionando que pode o empregado estabelecer normas no
contrato individual com preponderância sobre as normas coletivas, desde que o
empregado tenha diploma universitário e receba salário mensal maior que duas
vezes o teto dos benefícios da Previdência (atualmente no valor de R$
11.158,00). As matérias que poderiam ser objeto de acordo são as mesmas que
poderiam ser discutidas em negociação coletiva (art. 611-A, CLT), itens “a” a
“i” relacionados no tópico anterior.
A Reforma também permite que o
empregado, independentemente do salário, “negocie” diretamente com a empresa os
seguintes pontos do contrato de trabalho:
a) Parcelamento de férias;
b) Conversão do trabalho presencial em
teletrabalho;
c) Acordo para extinguir o contrato com
a redução do pagamento das verbas rescisórias;
d) Recebimento das verbas rescisórias
sem a homologação do sindicato;
e) Assinatura de termo de quitação
anual das obrigações do seu contrato perante o sindicato;
f) Banco de horas semestral;
g) Jornada 12 x 36;
h) Prêmios e abonos.
Além da inconstitucionalidade latente
que poderá ser alegada em algumas das matérias acima (como no caso do banco de
horas e da jornada 12 x 36), não se pode perder de vista que o empregado poderá
pedir a nulidade destes acordos perante a Justiça em razão de coação, premido
por necessidade (medo de perder emprego) ou mesmo por falta de entendimento das
consequências do acordo. Essas circunstâncias, conforme preveem os artigos 138/157
do Código Civil, podem anular esses acordos. Também serão nulos de pleno
direito os acordos que impeçam, desvirtuam ou fraudem a lei trabalhista (art.
9º, CLT).
Quanto ao estabelecimento de prêmios e
abonos, estes ficarão desvinculados da remuneração e, por conseguinte, não
refletirão nas demais parcelas do contrato e recolhimentos fiscais e
previdenciários. Isto pode aumentar as tentativas de fraudes, substituindo-se
salários por prêmios e abonos, com o objetivo de reduzir os encargos.
É importante alertar, porém, que será
considerado fraude os prêmios concedidos a muitos trabalhadores de forma
habitual.
2.4
Do que não é permitido reduzir ou suprimir na negociação coletiva
O artigo 611-B, inserido pela Reforma,
enumera os direitos que não poderão ser reduzidos ou suprimidos pela via da
negociação coletiva. São, em sua maioria, os direitos previstos nos incisos do
artigo 7º da CF:
a)
Registro em carteira de trabalho;
b) Valor
do FGTS e multa;
c) Seguro
desemprego;
d)
Salário mínimo;
e) Décimo
terceiro salário;
f)
Adicional noturno;
g)
Salário-família;
h)
Descanso semanal remunerado (DSR);
i)
Adicional mínimo de 50% sobre o valor das horas extras4;
J)
Quantidade de dias de férias e adicional de 1/3;
l) Licença
maternidade de 120 dias e paternidade;
m) Aviso
prévio;
n) Normas
de saúde, higiene e segurança (exceto intervalos);
o)
Adicional de insalubridade/periculosidade/penosidade;
p)
Aposentadoria;
q)
Prescrição;
r) Emprego
de menores de 16 anos, exceto aprendizes;
s)
Proteção a crianças e adolescentes;
t)
Liberdade de associação sindical e direito de greve (atividades essenciais);
u)
Pagamento de tributos;
v)
Nenhuma discriminação aos trabalhadores em razão de deficiência, sexo, idade,
cor, situação familiar e gravidez;
x)
Algumas proteções à mulher e filhos previstas nos artigos 373-A, 390, 392-A,
394, 394-A, 395, 396 e 400 da CLT;
z)
Igualdade entre trabalhadores permanentes e avulsos.
2.5
O provável fim da contribuição (imposto) sindical ao torna-lo facultativo
A Reforma tornou facultativo ao
trabalhador o desconto da contribuição sindical (mais conhecido como “imposto
sindical”), principal fonte de arrecadação dos sindicatos. É inegável que,
nestas condições, a arrecadação desta contribuição sofrerá grande redução. Mais
provavelmente, a sua própria extinção.
Por outro lado, é sabido que o modelo
sindical brasileiro, caracterizado pela unicidade sindical e contribuições
obrigatórias, faz com que os sindicatos sejam pouco representativos e atuem “distantes”
do local de trabalho. Outra característica derivada deste modelo é a pulverização
de sindicatos, a partir do critério de desmembramento das categorias
profissionais pela especificidade, adotado pela Justiça do Trabalho.
Com a provável queda acentuada da
arrecadação, inúmeros sindicatos deverão desaparecer. Aqueles que conseguirem manter
seu funcionamento terão ainda a árdua tarefa de se transformar, por meio da
reaglutinação de categorias e da criação de novas formas de arrecadação.
2.6
Restrição de acesso à Justiça do Trabalho
Até a aprovação da Reforma, a Justiça
do Trabalho era acessível ao trabalhador. Era quase inexistente o risco do
trabalhador ter que pagar as “custas” e despesas processuais, caso perdesse a
ação. Após a Reforma, o empregado terá
mais riscos com a sua ação. Se ele não for beneficiário da justiça gratuita e
perder a ação, terá que pagar as “custas”, honorários advocatícios da parte
contrária e honorários periciais, se for o caso.
Mesmo aquele que for beneficiário da
justiça gratuita (salário até o valor de R$ 2.231,60, atualmente) poderá ter
que arcar com o pagamento dos honorários periciais, custas e honorários
advocatícios da parte contrária, se tiver créditos decorrentes de outras ações
judiciais ou ficar provado pelo credor que voltou a ter condições financeiras
de pagar a dívida no prazo de dois anos5.
Neste ponto, as opiniões sobre o
aumento ou redução das demandas trabalhista se dividem. Em matéria do jornal Valor Econômico de
04/07/2017, já citada neste artigo, representante de alguns bancos afirmam que
esperam reduzir suas “contas bilionárias” com condenações trabalhistas por
conta dos custos da ação trabalhista para o empregado.
Contudo, a Associação Nacional dos
Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) estima um incremento superior a
30% das demandas de ações judiciais em virtude das rediscussões de questões
consolidadas, como a terceirização e de inconstitucionalidade no texto da
reforma (Valor Econômico, 13/07/2017).
Acrescente-se, ainda, a insegurança
jurídica que a reforma impôs ao dificultar sobremaneira a formulação de súmulas
de jurisprudência no Tribunal Superior do Trabalho (TST). Estando o TST limitado
na edição de súmulas que uniformizem a jurisprudência, e no caso de cada
Tribunal Regional (atualmente há 24) decidir de uma determinada forma sobre o
mesmo assunto, as ações judiciais poderão aumentar e, por conseguinte, a
insegurança jurídica.
2.7
Novas espécies de contratação previstas na Reforma Trabalhista
Além de toda a possibilidade do risco
da precarização que a Reforma traz ao privilegiar a autonomia coletiva e
individual sem a proteção aos trabalhadores e aos sindicatos, ela também trouxe
algumas espécies novas de contratos de trabalho, bem como alterou as já
existentes.
2.7.1
Terceirização da atividade-fim
A Reforma expandiu a possibilidade de
contratação de empregados por empresas interpostas (ampliou a terceirização). A
contratante poderá transferir qualquer atividade, inclusive a principal, para a
prestadora.
Caso a prestadora de serviços não
cumpra suas obrigações trabalhistas, a contratante responderá apenas
subsidiariamente com a dívida.
Além disso, não há garantia de isonomia
salarial entre os empregados diretos e os terceirizados.
A única salvaguarda é a “quarentena” de
18 meses para a terceirizada contratar um empregado dispensado pela tomadora.
Em razão da lei não prever qualquer
restrição, há discussão sobre a aplicação desta espécie de contrato no serviço
público, o que esbarraria na sua inconstitucionalidade, em razão da necessidade
de concurso público para a contratação de trabalhadores nesta esfera
administrativa (art. 37, II, CF).
2.7.2
Trabalho temporário
A alteração mais significativa nesta
espécie de contratação foi a ampliação do prazo do contrato de trabalho, que
passou de seis para nove meses.
O empregado temporário tem vínculo de
emprego com a empresa de serviço temporário, mesmo que ele receba ordens
diretamente da contratante.
O serviço temporário deve ser utilizado
para substituir empregados da contratante ou atender demanda suplementar
(fatores imprevisíveis ou demandas sazonais, periódicas ou intermitentes). O
mesmo trabalhador temporário só pode trabalhar para a mesma tomadora após 90
dias do contrato anterior.
2.7.3
Trabalho intermitente
O trabalhador nesta nova modalidade
contratual terá registro em carteira e demais direitos previstos na lei. No
entanto, receberá salário apenas quando prestar serviço. Ou seja, esse
trabalhador não terá o fator continuidade na prestação de serviços.
Ele ficará a disposição da empresa para
trabalhar a qualquer momento: a empresa terá que avisá-lo com até 3 dias
antecedência; por sua vez, o empregado pode confirmar até 1 dia antes da
prestação do serviço. Para o infrator, o não comparecimento ou o cancelamento
do serviço representará multa de 50% da remuneração que o empregado receberia.
A lei garante apenas o salário mínimo
por hora. Ou seja, o empregado poderá, ao final do mês, receber menos que um
salário mínimo mensal. Todas as suas verbas serão calculadas pela média que
receber de remuneração (13º, férias, DSR, FGTS, etc).
Essa forma de contratação é o que
muitos denominam de “formalização dos bicos”. Deste modo, ela poderá mascarar
as estatísticas de desemprego, pois esses trabalhadores poderão ficar semanas
ou meses sem trabalhar, mas não entrarão nas estatísticas.
Registre-se que essa forma de trabalho
retira do trabalhador o seu direito de ser desligado do emprego, se a empresa
não utilizar sua mão-de-obra.
Por fim, apesar da lei autorizar esse
empregado a ter outros empregos, será difícil para ele conciliar os dias de
trabalho, ficando fadado a receber baixa remuneração, tendo apenas uma fonte de
renda.
2.7.4
Teletrabalho ou “home office”
A lei prevê que não se aplica a este
empregado as normas de proteção sobre jornada (horas extras, limites de jornada,
adicional noturno, DSR, etc).
No tocante às normas de segurança e
saúde, o empregado apenas assinará um termo de que recebeu orientação sobre
elas.
A lei é omissa sobre quem arcará com os
custos com equipamentos, energia elétrica, internet, etc.
Além disso, ela autoriza o empregador a
alterar o trabalho de home office
para presencial a qualquer momento.
2.7.5
Trabalho autônomo
Este trabalhador não tem registro em
carteira ou qualquer outro direito previsto na CLT. Ele apenas recolhe a
contribuição previdenciária.
A lei traz a possibilidade de a empresa
exigir a exclusividade na prestação do serviço autônomo.
O fator continuidade na prestação do
serviço também deixa de ser um dos critérios que caracterizam uma relação de
emprego neste caso. Assim, a subordinação será a única situação que poderá
caracterizar um vínculo de emprego para o autônomo.
O curioso destas duas formas de
contratação – autônomo e intermitente – é que o critério de ausência de
continuidade perdeu a relevância para não caracterizar um vínculo de emprego.
Assim, não há mais “desculpas” para o empregador deixar de registrar, por
exemplo, uma faxineira. Se ela comparece duas vezes ou menos durante a semana,
terá que ser registrada, ainda que na condição de intermitente.
3. Algumas tendências após a
Reforma Trabalhista
Neste momento, após aprovada a
reforma e às vésperas de sua efetiva aplicação, verifica-se certa expectativa
do empresariado, dos sindicatos e da população em geral sobre como funcionarão
as novas regras impostas pela Reforma Trabalhista. Por envolver questões muito técnicas, o
assunto é dominado apenas por alguns especialistas. Além disso, ao gozar do
apoio da grande mídia, predomina uma visão “rósea”, otimista, benéfica ou
eufemística da reforma.
Assim, nesta seção, pretendemos,
de maneira tópica e tabular, levantar algumas possibilidades mais realistas de
repercussão da reforma trabalhista. Tratam-se, ainda assim, de conjecturas,
cujo objetivo é ajudar a sistematizar o olhar sobre o futuro.
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Variável
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Tendência
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Emprego e
massa salarial
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Visto no curto e no médio prazo, a tendência é a
possibilidade de alguma geração de postos de trabalho com carteira assinada,
mas isto NÃO garante:
a) que haverá uma redução expressiva da taxa de
desemprego, como alega o governo, posto que o número de empregos de uma
economia não depende determinantemente da legislação trabalhista, mas do
aumento da taxa de investimento. A taxa de investimento, como se sabe, está
comprimida, em virtude de vários fatores, entre os quais a medida de
contenção dos gastos públicos;
b) que a massa salarial cresça, já que os
contratos de trabalho em sua grande maioria serão mais precarizados, com
reflexos no salário médio. Ao contrário: a tendência mais provável é que,
mesmo havendo algum incremento de postos de trabalho, ocorra a queda da massa
salarial.
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Produtividade
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Vários discursos e artigos dos defensores da
reforma trabalhista apontam, genericamente, para o efeito positivo da reforma
sobre o aumento da produtividade das empresas e do país. O Ministério do
Planejamento veiculou na mídia cálculos que indicam para um suposto aumento
entre 1,5% e 2% da produtividade durante os próximos dez anos, em função da
reforma trabalhista (O Estado de São Paulo, 3/6/2017).
Os discursos e os cálculos partem da aposta de
que a prevalência do negociado sobre o legislado gerará efeitos benéficos,
como melhor ajuste e flexibilidade da jornada de trabalho às oscilações de
produção. Além disso, os incentivos gerados pelo incremento da renda variável
(prêmios, abonos, PLR) - cujo alargamento na composição da renda é permitido
pela nova legislação - poderia estar associados às metas de incremento da
produtividade.
O home
office seria um dos fatores que também contribuiriam para o aumento da
produtividade.
Registre-se, porém, que estes cálculos e
hipóteses são frágeis, pois não levam em conta também os prováveis efeitos
negativos sobre a produtividade gerados pela precarização do trabalho, como é
o caso do menor comprometimento dos trabalhadores em função dos vínculos mais
tênues com as empresas.
Em razão da inexistência de controle sobre o
excesso de jornada de trabalho, é possível que ocorra um aumento dos
acidentes e das doenças profissionais. Isto também pode contribuir para
reduzir a produtividade.
Sobre o home
office, vale citar aqui matéria da Revista Exame, de 28/5/2013, que diz:
“No início
de 2013, [a empresa Yahoo!] sacudiu (...) o mundo do trabalho ao convocar
todos os funcionários (...) que trabalhavam remotamente para retornar à
rotina na sede da empresa, em Sunnyvale, no estado americano da Califórnia.
Em nota divulgada aos cerca de 11.500 funcionários, a vice-presidente
executiva de pessoas e desenvolvimento (...) afirmou que ‘velocidade e
qualidade são muitas vezes sacrificadas quando se trabalha de casa’”.
A mesma matéria da Exame relata que: “Uma pesquisa da locadora de escritórios
Regus feita com 24.000 profissionais de mais de 90 países, entre eles o
Brasil, apontou os principais problemas do home office. Segundo o estudo, a
dificuldade para se concentrar no trabalho lidera a lista de desvantagens.
Entre os brasileiros, 64% apontam as distrações familiares como o principal
problema e, como reflexo, 44% deles têm dificuldade de concentração em
questões do trabalho”.
Vale ter claro ainda, neste tópico, que a
produtividade das empresas e da economia um todo tem forte relação com a
capacidade do País e das empresas em promover inovações de produto e de processo,
adotando as inovações no processo produtivo. A capacidade de inovação, por
sua vez, está fortemente relacionada com a qualidade da educação do país.
Neste sentido, não são otimistas as projeções para o Brasil, especialmente se
levada em conta novamente a política de contenção dos gastos públicos nos
próximos vinte anos.
Pelo exposto, não é possível sustentar confiança
na existência de uma relação positiva entre a atual reforma trabalhista
aprovada e a produtividade das empresas e do país.
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Investimentos
(nacionais e estrangeiros)
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A redução do custo do trabalho será apresentada
como fator de atratividade do país. É o que se denomina de “competitividade
espúria”. Entretanto, como já exposto, a legislação trabalhista e o correspondente
custo do fator trabalho não costumam ser elementos decisivos na tomada de
decisão das empresas em relação aos seus investimentos. É a expansão do
mercado brasileiro que, sobretudo, costuma pesar decisivamente nas decisões
de investimento no país.
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Arrecadação
previdenciária
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A tendência é de um forte impacto negativo da
reforma trabalhista sobre a arrecadação previdenciária.
As empresas devem implementar mudanças em suas
políticas de recursos humanos, aumentando o peso da remuneração variável, na
forma de prêmios, abonos e PLR, haja vista a não incidência da contribuição
previdenciária sobre esses valores. O mesmo ocorre com relação às diárias de
viagens.
Outro fator que deverá fazer cair a arrecadação
previdência é a própria queda do salário médio (e da massa salarial), em
virtude da precarização do trabalho e da terceirização.
Registre-se também a dificuldade da Receita em
fiscalizar as inúmeras empresas prestadoras de serviços. Estas empresas prestadoras de serviços
caracterizam-se ainda pelos baixos valores de capital, o que gera a dificuldade
de pagamento destes débitos.
A queda da arrecadação previdenciária é um dos
pontos de maior vulnerabilidade da nova legislação trabalhista, que pode inclusive
quebrar consensos entre os seus defensores.
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Processos
trabalhistas
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Os defensores da Reforma Trabalhista argumentam
que a nova legislação deverá levar a uma redução dos processos, em função do
aumento da segurança jurídica e do aumento dos custos para o trabalhador.
No entanto, como já exposto ao longo deste
artigo, a tendência deverá ser o aumento das ações judiciais, tendo em vista
as várias contradições e inconstitucionalidades da reforma trabalhista.
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Espécies
de contratação
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Dadas as possibilidades abertas pela nova
legislação trabalhista, em termos de expressiva redução de custos com as
novas contratações, é provável que haja uma redução significativa da forma tradicional dos contratos de trabalho
por prazo indeterminado e um incremento das participações do trabalho
temporário, intermitente, autônomo e teletrabalho.
O trabalho terceirizado também deverá ampliar-se
significativamente, avançando-se para a atividade-fim das empresas.
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Desigualdade
social
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A tendência é que os índices de desigualdade (o
Índice de Gini, por exemplo) piorem no país.
A precarização do trabalho, fruto das novas
modalidades de contratação do trabalho, combinado com a terceirização em
larga escala, deverá ampliar a diferença de inserção dos trabalhadores no
mercado de trabalho. O resultado deverá ser um aumento da amplitude da
estrutura salarial das empresas e uma piora nos índices de concentração da
renda, com o aumento da desigualdade.
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Sindicalismo
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Pelos motivos já expostos, a tendência, a
princípio, é o enfraquecimento dos sindicatos, com o consequente rebaixamento
das negociações coletivas, bem como a crise financeira de vários sindicatos, gerada
especialmente pelo fim da contribuição (imposto) sindical.
Entretanto, é possível vislumbrar um cenário
alternativo – construído em um processo de resistência e luta – no qual os
sindicatos buscam se reestruturar, especialmente por meio da unificação com
outros sindicatos.
Neste cenário, a constituição de sindicatos
maiores pode ampliar o de peso destes sindicatos nas negociações e, por
conseguinte, viabilizar no longo prazo o surgimento de melhores acordos.
No âmbito do local de trabalho, embora a reforma
tenha possibilitado a criação de comissões de empresas desvinculadas do
Sindicato, é possível acreditar que, em alguns casos, possa haver uma reação,
com a implementação de uma política de aproximação e conquista destas
representações pelos Sindicatos.
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Negociações
trabalhistas
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Um efeito imediato deverá ser o impasse nas mesas
de negociação logo após a Reforma Trabalhista, em virtude dos Sindicatos,
legitimamente, almejarem garantir cláusulas que “amenizem” o impacto da
reforma.
Outra tendência será a luta permanente dos
sindicatos em buscar garantir direitos e conquistas que já estavam
consolidados na lei e normas coletivas. Basta um exemplo singelo: a garantia
de que a homologação de rescisão contratual seja feita no Sindicato. Assim
como este, uma série de normas já estabelecidas como usuais serão postas em
xeque, indicando um claro retrocesso nas pautas de negociação.
No médio prazo, as negociações coletivas tendem
também a apresentar grau de diferenciação dos conteúdos acordados entre
patrões e empregados maior do que se verifica hoje, por conta da adequação do
acordo à realidade de cada categoria e da prevalência do negociado sobre o
legislado.
No que se refere aos acordos individuais,
permitidos pela nova legislação, a
tendência deverá ser o aumento do número destes acordos. Contudo, no médio
prazo, é provável que o resultado seja o aumento de pedidos na Justiça da
nulidade destes acordos, em razão da fragilidade dos empregados na relação de
emprego. É possível que uma parte destes acordos sejam de fato anulados pela
Justiça do Trabalho.
Registre-se a tendência de que cresça o número de
instituições e profissionais em serviços relacionados ao apoio de empregados
e empregadores na arte da negociação.
O papel ampliado da negociação coletiva após a
reforma exigirá que as empresas tenham maior transparência e que forneçam aos
sindicatos um amplo volume de informações. Os Sindicatos, por sua vez,
precisarão estar mais preparados, demandando especialização e capacitação
para a negociação. O fortalecimento das assessorias sindicais (jurídicas,
econômicas, de saúde do trabalhador, de formação, entre outras), e de
entidades como o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócioeconômicos
(DIEESE) é essencial na estratégia de fortalecimento sindical.
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Vale concluir este artigo
lembrando que o conjunto de regulamentações normativas do trabalho é um
fenômeno social complexo e dinâmico. Assim, mesmo que o espirito que norteia a
reforma trabalhista seja amplamente favorável ao capital, com o objetivo claro
da redução dos custos do trabalho combinado com a segurança jurídica para as
empresas, não é possível saber exatamente ao certo o resultado final do
processo. A luta dos Sindicatos e das forças democráticas podem sempre alterar
o quadro colocado.
O Brasil encontra-se em um
momento de ruptura institucional e isto se refletiu na Lei da Reforma
Trabalhista aprovada. Contudo, nem o país, nem os atores e instituições do
mundo do trabalho, permanecerão sempre nesta quadra cinzenta da vida nacional.
Jefferson José da Conceição - Prof.Dr.da USCS
Maria da Consolação Vegi - Advogada e Coordenadora do Depto. Jurídico
do Sindicato dos Bancários do ABC
Notas:
1. O Diplomata
Paulo Sergio Pinheiro, criador na década de 1980 do Núcleo de Estudos da
Violência, afirmou em entrevista ao Valor Econômico de 10/8/2017: “A recém-aprovada reforma trabalhista é um
retorno ao século XIX, com jornada de trabalho de até 12 horas. Um deputado até
tentou, sem sucesso, reinstalar o trabalho rural sem salário, quer dizer
restaurar a escravidão. Em outra frente, vemos o enfraquecimento da repressão
ao trabalho escravo”.
2. É digno de
registro, pelo simbolismo da resistência, o fato de que, de maneira inédita na
história do Congresso, em 11 de julho, dia da votação da Reforma Trabalhista no
Congresso, as senadoras Gleisi Hoffmann (PT-PR), Fátima Bezerra (PT-RN),
Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Regina Souza (PT-RN), Lídice da Mata (PSB-BA) e
Ângela Portela (PDT-RR), tenham ocupado por sete horas a mesa de trabalhos do
Senado para tentar impedir a votação da reforma trabalhista.
3. “São direitos dos trabalhadores urbanos e
rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição sócia” (caput,
art. 7º da CF).
4. Matéria do
jornal Valor Econômico de 14/08/2017 informa que, de acordo com o levantamento
do TST, os litígios sobre horas extras representaram de 16 a 19% das ações na
Justiça do Trabalho em 2016.
5. A
Procuradoria Geral da República (PGR) ingressou com Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) no STF pedindo a declaração de
inconstitucionalidade da regra que permite a cobranças das custas, honorários
periciais e advocatícios para os beneficiários das justiça gratuita.
Artigo publicado em 4 de outubro de 2017 na Revista Teoria e Debate.