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segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

POLÍTICA DE EMPREGO: NÚMEROS, MESMICE E INSENSIBILIDADE



Jefferson José da Conceição

Acabam de serem divulgados os dados do nível de emprego formal (isto é, com carteira assinada) no Brasil em 2016. O anúncio foi feito pelo Ministério do Trabalho, com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados - CAGED.

O Ministério emitiu um “comunicado” oficial com a apresentação e interpretação destes números. Aqui, desde já, cabe um registro: entendo que estes dados sobre a evolução do emprego deveriam ser expostos e analisados publicamente pelo Ministério da Economia (Fazenda, no caso), que é o principal responsável pela formulação e execução da Política Econômica do País. Cabe ao Ministério da Fazenda responder pelos números negativos ou positivos em relação ao tema do emprego. Certo que a intermediação de mão-de-obra (disponibilização pública de ofertas e procuras de empregos por meio do sistema público de emprego) é de responsabilidade do Ministério do Trabalho, mas a intermediação, em que pese sua elevada importância, não é geradora de atividade econômica. Não é a intermediação que determina o volume total de vagas de trabalho disponíveis. Isto é função da política macroeconômica, de responsabilidade do Ministério da Fazenda.

Posto este registro, voltemos ao anúncio feito pelo Ministério do Trabalho, em nome do Governo. Uma vez mais, como de outras vezes, impactou-me pelo eufemismo, falta de cuidado e mesmice em relação a tema tão sensível ao ser humano, que é o do emprego.

Por que eufemismo?  Porque os dados, inequivocamente, mostram que houve um grande corte de empregos no ano passado. Em 2016, foram eliminados 1.321.994 empregos! Mas, o quadro é ainda pior, porque, em 2015, o País já havia ceifado 1.534.989 empregos! Por conseguinte, no biênio 2015-2016, foram cortados no total 2.856.983 empregos formais! Ou seja, em 2016 foram expulsos do mercado de trabalho um grande número de pessoas que se soma a um enorme contingente já existente. Entretanto, em nenhum momento, o comunicado do Governo cita esta somatória simples e trágica ao mesmo tempo.

Ao contrário, o governo quer nos fazer acreditar que a situação melhorou! Diz a nota oficial:

“Apesar dos números ainda serem negativos, a comparação já mostra uma diminuição significativa no fechamento de vagas. A crise começou a perder fôlego em abril de 2016, quando o país registrava o pico de 1.825.609 vagas fechadas em um período de 12 meses. Mas esse número começou a cair mês a mês. No final do ano, a perda em 12 meses já estava menor em 503.615 postos. Em dezembro, mês que historicamente apresenta forte aumento no número de demissões, a perda foi de 462.366 vagas, 22,4% menor do que no mesmo período de 2015, outro dado que mostra o arrefecimento na crise do emprego”.

Além de pintar o quadro mais próximo da realidade, portanto menos róseo do que pintou, a nota do Ministério do Trabalho deveria também ser mais cuidadosa, mais completa. Apoiando-se também em outras pesquisas oficiais do mercado de trabalho (mesmo que o foco seja apresentar os dados do CAGED), a nota deveria deixar claro que, de modo preocupante, vem caindo o número de pessoas ocupadas no Brasil.

Assim, de acordo com a pesquisa Nacional por Amostragem Domiciliar (PNAD), em 2015, o país já havia verificado pela primeira vez desde 2004 a queda no número de pessoas ocupadas (redução de 3,9%, que significa um total de 3,8 milhões de pessoas ocupadas a menos). E este processo de redução da ocupação continuou em 2016: a última informação disponível da PNAD evidenciou que no trimestre encerrado em outubro de 2016 a ocupação era de 89,9 milhões de pessoas, contra 92,2 milhões em julho daquele ano.

Como consequência, o Brasil tem atualmente (mais precisamente, os números são de outubro de 2016) um total de mais de 12 milhões de desempregados! A taxa de desocupação saltou de 6,5% no trimestre out-dez de 2014 para 11,8% no trimestre ago-out de 2016! Há estimativas que apontam que até o meio do ano ela deve ser superior a 14%. 

Em um quadro como este, os efeitos são em cascata:  cai a arrecadação da previdência, reduz a renda média da população, aumentam os problemas de saúde física e mental da população, cresce a violência...

Em outras palavras, não cabe a menor sensação de conforto porque, comparando-se 2016 com 2015, o tamanho do corte foi 14% menor em 2016 (1,3 milhão contra 1,5 milhão de eliminação de empregos em 2016 e 2015, respectivamente). 

A queda dos investimentos públicos (agravada pela aprovação da PEC 55, que limita os gastos públicos nos próximos vinte anos) e privados, a retração da renda e do consumo e a ainda tímida redução da taxa de juros são fatores que nos levam a acreditar que 2017 representará ainda um corte expressivo do número de empregos no Brasil.

Sair da mesmice em relação à temática do Emprego

Há muito acredito que a temática do emprego, em termos de pesquisa, análise e formulação de políticas públicas, carece de uma perspectiva mais ampla e abrangente, isto é, de uma visão interdisciplinar.

Evidentemente, a política econômica é chave na determinação do nível de atividade e, por conseguinte, no nível de empregos disponíveis. Mas a temática do emprego – tão sensível na vida das pessoas – não se resume ao número de empregos ofertados e demandados. Há a legislação que a norteia, os elementos educacionais e de formação, os aspectos sociais e de sociabilidade, as questões de saúde e de natureza psicológica envolvidos, entre outras áreas de especialização.

Por conseguinte, esta visão multidisciplinar tem que se refletir na constituição de grupos técnicos multidisciplinares (organizados nas universidades, no setor privado, no governo) que elaborem pesquisas conjuntas, analisem e divulguem resultados conjuntos, formulem políticas públicas de modo conjunto.

A visão multidisciplinar, por si, isolada, não resolve a questão da necessária geração de empregos no país. Mas certamente ajudará  em muito a sair da mesmice e mediocridade que hoje nos situamos em relação à temática do emprego. Isto permitirá também que o emprego não seja tratado apenas como uma comparação limitada e mal feita de números.

Jefferson José da Conceição é Prof. Dr. da Universidade Municipal de São Caetano do Sul, USCS. Foi Secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo de São Bernardo (jan.2009-jul.2015); Superintendente do SBCPrev (agos.2015-fev.2016); Diretor Técnico da Agência São Paulo de Desenvolvimento (mar.2016-jan.2017).

Artigo publicado no site do ABCDMaior, coluna blogs, em 23/1/2017.

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