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quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Economista apoia greves e afirma que há meios para indústria sair da crise

Entrevista à Rede brasil atual, publicada em  18/2015, Disponível 
em http://www.redebrasilatual.com.br/economia/2015/02/economista-apoia-greves-e-afirma-que-ha-alternativas-para-industria-sair-da-crise-2875.html

Economista apoia greves e afirma que há meios para indústria sair da crise

Secretário de Desenvolvimento Econômico e Turismo de São Bernardo do Campo defende medidas como o aprofundamento do programa Inovar-Auto e novos incentivos ao consumo
por Maurício Thuswohl, no Portal Inova* publicado 18/02/2015 15:25, última modificação 18/02/2015 18:33
ABCD MAIOR / ANDRIS BOVO
jefferson da conceição.jpg
Jefferson considera o Inovar-Auto um bom programa: "Ele associa os incentivos tributários à inovação e tecnologia"
São Bernardo do Campo – Secretário de Desenvolvimento Econômico e Turismo de São Bernardo do Campo, no ABC paulista, Jefferson da Conceição é um profundo conhecedor dos altos e baixos da indústria no ABC paulista. Com trajetória ligada ao Sindicato dos Metalúrgicos e à Central Única dos Trabalhadores (CUT), onde atuou como economista do Dieese por mais de duas décadas, ele é também autor de livros como Quando o Apito da Fábrica Silencia, entre outros, que analisam a economia regional e nacional. Do alto de sua experiência, Jefferson diz que existem meios para tirar a indústria automobilística da atual crise e defende as greves e mobilizações dos trabalhadores do setor. Ele faz sugestões para melhorar a implementação do Programa Inovar-Auto e fala sobre ações que o poder público local promove para incentivar a inovação e a competitividade. Leia a seguir a entrevista, publicada no Portal Inova.
Após a queda de produção em 2014 e um início de ano com demissões e greves, a indústria automobilística brasileira tem meios de sair da crise? Em sua opinião, o que precisa ser feito?
Evidentemente que há meios de sair da crise. A crise não será a primeira nem a última do setor. Em diversos momentos da história de nosso país tivemos situações semelhantes: no início da década de 1960, nos anos 1980, nos anos 1990, no início dos anos 2000. Além das políticas econômicas que impactam o setor em cada momento, cabe destacar ainda, como fatores causais, o cenário internacional, que pode ser mais favorável ou menos, como agora. De resto, o ciclo é característico das economias capitalistas. Depois de uma forte expansão do consumo, produção e investimentos como a que ocorreu após 2004, é natural que haja uma fase de refluxo e acomodação das empresas, para que as margens de rentabilidade dos negócios e a capacidade de pagamento dos consumidores possam ser restabelecidas.

Mas, é claro também que é possível agir e tomar medidas anticíclicas com vistas a retomar mais rapidamente a atividade econômica do setor automotivo. Entre outras medidas, cabe discutir, a meu ver, o aprofundamento e conclusão do Inovar-Auto; novos incentivos ao consumo interno (financiamento e tributos) e às exportações; implementar o Modermaq, elaborado na primeira gestão do governo Dilma, e também o Programa de Renovação e Reciclagem da Frota, tanto para caminhões como para os veículos de passeio. E, diante de situações mais agudas de demissões, é perfeitamente defensável a adoção das políticas de proteção ao emprego, como vêm sendo propostas pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC neste momento.

As medidas previstas no Programa Inovar-Auto do governo federal já se refletiram na cadeia produtiva do ABC paulista? É possível torná-las mais efetivas? Como?

De fato, as medidas do Inovar-Auto foram parcialmente implementadas. Portanto, o impacto do Programa também foi parcial no Brasil e no ABC paulista. Quero realçar, no entanto, que o Inovar-Auto é um bom programa. Ele associa, pela primeira vez, os incentivos tributários à inovação e tecnologia. Isto é muito positivo porque é uma política estruturante e não apenas de natureza conjuntural. Mas há de se reconhecer que houve uma relativa demora na conclusão desta política industrial, na divulgação de portarias que deveriam detalhar o Programa concretamente. A própria rastreabilidade é um desses itens que sofreu grande demora. As empresas retardaram tomadas de decisões, para esperar o detalhamento do programa. Mencione-se também a não implementação do Inovar-Peças, que ajudaria a fomentar os segmentos nacionais que compõem a base da pirâmide automotiva, formada, entre outros, por siderurgias, forjarias, fundições, usinagens, ferramentarias, produtores de máquinas e equipamentos, pequenas peças e componentes. Desta forma, o impacto positivo do Inovar-Auto foi parcial. Precisamos que todas as regras do jogo estejam bem claras para todos os agentes econômicos.

O desânimo do empresariado industrial nacional, registrado em algumas pesquisas feitas desde meados do ano passado, tem cura? Alinhar empresários, poder público e trabalhadores em um mesmo rumo político pelo desenvolvimento do país é uma utopia?
A “cura” a qual você se refere já é conhecida há tempo. Quando o consumo, a produção e a lucratividade são retomados, a cura acontece naturalmente e as críticas diminuem. Quando o oposto ocorre, como agora, as críticas e o desânimo aumentam. Portanto, podemos concluir que se constata um ciclo também em relação às expectativas, que ora são otimistas, ora pessimistas. É nítido que hoje não estamos no ponto mais alto do ciclo. Estamos em fase de dificuldades e em alguns casos até de retração. Por conseguinte, o mau humor predomina. Ao primeiro sinal de inversão da curva de expectativas, o humor modificará.

Poder público, empresários e trabalhadores podem, e devem, buscar pontos comuns de entendimento a partir dos quais se construa uma política de desenvolvimento. Isto não é utopia. Em vários momentos isto aconteceu no Brasil. Exemplo disso foram as Câmaras Setoriais do inicio dos anos 1990, com destaque para a Câmara Setorial Automotiva, que tinha natureza tripartite, encarou problemas emergenciais e estruturais – como a baixa produção da época e a concorrência com os importados – e estabeleceu metas de produção e emprego. Depois da Câmara, e em um período mais recente, tivemos momentos importantes de aproximação entre estes três agentes (poder público, empresários e representações sindicais) como a própria negociação do Inovar-Auto e o Arranjo Produtivo Local (APL) de Ferramentaria no ABC paulista.

De que maneira o poder público (prefeituras) pode contribuir para incentivar mais decisivamente a busca por inovação e competitividade da indústria no ABC paulista? O que tem sido feito até aqui?
A atuação da política municipal e regional é mais limitada do que a ação do Estado e do País. Instrumentos como a taxa de juros, a taxa de câmbio e as tarifas de importação, entre outros, não são controlados e determinados em âmbito destas esferas de governo. Reconhecer isto não significa dizer que o poder público local não pode fazer nada. É possível sim ter políticas ativas municipais e regionais e ter resultado efetivos. No caso de São Bernardo, nas duas Gestões do prefeito Luiz Marinho (de 2009 até agora), adotamos políticas ativas em prol da competitividade da indústria do município e da região. Em 2009, em plena crise, ajudamos a realizar, juntamente com o sindicato, o seminário 'ABC do Diálogo e do Desenvolvimento', que teve um importante papel em chamar a atenção para o problema da crise naquele momento e para a construção de políticas que ajudaram no encontro de soluções concretas. Posteriormente, incentivamos a constituição, funcionamento e crescimento de onze APLs, que vêm discutindo agendas setoriais de desenvolvimento. São os casos, por exemplo, dos APLs de Ferramentaria, Têxtil e Confecções, Móveis, Gráficos, Defesa, Panificação, Químicos, Economia Criativa, entre outros. Nestes APLs, participam gestão pública, empresários, sindicatos, universidades, Senai, Sebrae, Senac, bancos, entre outros agentes e instituições. Neles, discutimos itens como qualificação profissional, compras conjuntas, busca de novos mercados, diversificação da produção, parcerias nacionais e internacionais, pesquisa e desenvolvimento tecnológico.

Temos também realizado uma série de ações que buscam chamar a atenção das empresas para as oportunidades nas áreas de Defesa e de Petróleo e Gás. Nossa tese é de que é possível ampliar e constituir novas linhas de produção em grande parte das empresas já instaladas na região, com vistas a atender a estes novos mercados, sem deixar de atender também ao cliente automotivo.

Outra ação muito forte que temos realizado é promover um papel de aproximação entre as indústrias e as universidades. Exemplo disso é a Missão que a Gestão Municipal de São Bernardo realizou à Suécia, em setembro de 2014, na qual participaram gestores públicos, empresários, reitores de universidades e sindicalistas. Além das parcerias entre universidades suecas e do ABC, dessa missão nasceu uma rodada de relacionamentos entre empresas brasileiras e suecas, que ocorrerá, em abril deste ano, na Feira Internacional de Defesa e Segurança chamada LAAD.

Qual sua opinião sobre o desenvolvimento da cadeia produtiva aeroespacial no ABC e no Brasil em geral? Podemos imaginar o ABC paulista, no futuro, sem a indústria automotiva como locomotiva de sua economia?
Não se trata de contrapor uma coisa à outra. Não se trata de deixar de produzir para o setor automotivo e passar a compor a cadeia de produção aeroespacial. Nossa tese central é, isto sim, que a indústria do ABC tem um perfil histórico, desde os anos 1950, centrado na cadeia automotiva, mas, neste momento, seu esforço deve ser o da diversificação de mercados. O desafio para os próximos anos é fazer com que nossas fábricas, equipamentos, gerências e mão de obra direta e indireta tenham capacidade de produzir também outros itens, além dos já produzidos e que queremos continuar produzindo. A ideia é, por exemplo, o seguinte: se eu tenho duas linhas de produtos focadas no setor automotivo, eu talvez possa ter uma terceira na área de defesa e aeroespacial. Ou seja, não se trata de fugir do que já temos hoje como trajetória e tradição. Trata-se de dar maior musculatura à nossa estrutura industrial de forma que ela possa atender outros mercados, além do próprio segmento automotivo.

Esse processo se coaduna perfeitamente com as necessidades do próprio segmento de defesa e aeroespacial. Estes são setores que, por suas características e grande dependência das compras governamentais, passam no Brasil por grandes e constantes oscilações orçamentárias. Se a empresa depender exclusivamente da área da defesa ou aeroespacial, ela pode ter grandes problemas. Por conseguinte, a combinação com o mercado automotivo também interessa ao setor de defesa e aeroespacial. Desta maneira, o futuro investimento em São Bernardo de uma fábrica de aeroestruturas relacionada ao projeto da aeronave supersônica Gripen, anunciado no pacote de contrapartidas (offset) negociadas entre a Aeronáutica e a Saab, foi um grande passo para o futuro da indústria do ABC paulista.

A redução de impostos e os projetos inovadores eram dois pilares do Plano Brasil Maior. A redução foi insuficiente para estimular a indústria automobilística? E os projetos inovadores do setor, saíram do papel?
A redução de impostos, para incrementar a competitividade da indústria automobilística e outros setores, precisa ser discutida sim. Mas esta discussão não é tão fácil e simples, porque as demandas de investimentos do Estado em áreas como infraestrutura e no campo social são muito grandes também. Estas demandas de investimentos estatais, note-se, são feitas pelos diferentes setores da sociedade, inclusive e principalmente os empresários. Isto nos remete a duas grandes discussões. A primeira é a necessidade de o Brasil enfrentar uma Reforma Tributária que, entre outros aspectos, desonere os investimentos e a atividade produtiva, mas tribute também as grandes rendas e fortunas. Não é um debate fácil, mas é um debate que o país precisa fazer. A segunda grande discussão é associar as desonerações tributárias setoriais à exigência de contrapartidas e cumprimento de metas pelas empresas. Como falei anteriormente, creio que este é um dos principais méritos do Inovar-Auto, que é o de condicionar a redução tributária à inovação tecnológica.

* Colaborou Michelly Cyrillo

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