Jefferson José da Conceição
Na contramão da recente proposta
feita pelo Presidente da CNI, este artigo não apenas se posiciona frontalmente contra
qualquer incremento da jornada de trabalho no Brasil, como defende a redução da
jornada semanal; a redução e limitação das horas extras; o controle e redução
da jornada anual de trabalho.
Em tempos de retrocesso, que tem
como pano de fundo a onda conservadora que veio junto com o impeachment da
Presidenta eleita Dilma Rousseff, o Presidente da Confederação Nacional da
Indústria, Robson Braga de Andrade, declarou, em reunião de lideranças da
“Mobilização Empresarial pela Inovação” com o Presidente interino Michel Temer,
realizada em 8/7/2016, que o governo deveria adotar "medidas muito duras"
na Legislação Trabalhista e na Previdência Social. O objetivo seria promover o
equilíbrio das contas públicas e aumentar a competitividade das empresas. Com
isto o Presidente da CNI já definiu quem tem que “pagar o pato”: os
trabalhadores assalariados.
Manuseando informações equivocadas,
incompletas e sem qualquer contextualização, o Presidente da CNI,
inadvertidamente, utilizou o caso da França, dizendo que, após as reformas
trabalhistas, hoje é permitido naquele país trabalhar até 80 horas por semana.
O Presidente da CNI não mencionou
que a jornada de trabalho na França é de 35 horas por semana! O limite máximo –
já computadas as horas extras – é de 48 horas por semana, não ultrapassando 10
horas de trabalho por dia. Medida
recente do Governo francês autoriza que, excepcionalmente, em alguns casos, a
jornada semanal alcance as 60 h semanais. Contudo, é necessário que a
autoridade administrativa autorize esta jornada. Ainda assim, a medida sofreu
séria oposição e protestos de grande parte da sociedade francesa. Portanto, a
realidade está longe do afirmado pelo Presidente da CNI.
Creio que o Presidente acaba de
reabrir o debate da jornada de trabalho. Só que o feitiço pode voltar-se contra
o feiticeiro: mesmo em um cenário de retrocessos, as propostas podem correr na
contramão do proposto por aquela entidade empresarial.
Registre-se também que, vinda da
“Mobilização Empresarial para a Inovação”, a proposta do Presidente da CNI não
é nada “inovadora”. Os segmentos mais atrasados do empresariado recorrentemente
propõem a ampliação da jornada de trabalho.
Neste sentido, creio ser bem
oportuno, nos parágrafos a seguir, reproduzir, com ajustes e atualizações,
artigo elaborado por mim, em parceria com Ilmar Ferreira da Silva e Patrícia
Toledo Pelatieri, publicado no livro “Hora Extra: o que a CUT tem a dizer sobre
isto” (disponível como e-book na internet). O artigo, intitulado “Hora extra e
estratégia sindical”, foi escrito em 2006, mas permanece atualíssimo, sendo um
bom contraponto, inclusive, às declarações recentes do Presidente da CNI.
A LUTA HISTÓRICA DOS
TRABALHADORES PELA REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO
A luta do movimento sindical
internacional pela redução do tempo de trabalho é travada em várias frentes:
·
redução da jornada diária, semanal, mensal, semestral e anual;
·
aumento dos dias de descanso, férias e feriados;
·
limitação das horas extras;
·
ampliação das licenças por acidente de trabalho,
maternidade e paternidade;
·
elevação da idade de ingresso do jovem no
mercado de trabalho;
·
antecipação da aposentadoria.
Ao longo do século XX, em
diversos países do mundo, a classe trabalhadora obteve conquistas em vários
destes fronts de batalha. Como resultado, a jornada anual, de acordo com
pesquisa da OCDE, caiu, entre 1890 e 1986, de 2770h para 1573h na França; de
2765h para 1627h na Alemanha; de 2770h
para 2099 no Japão; e de 2789 para 1683 nos EUA (fonte: Nouvelles Technologies, OCDE, 1988).
AS DÉCADAS DE 1980 E 1990: RETROCESSO E PRECARIZAÇÃO DO TRABALHO, COM A
CONSEQUENTE AMPLIAÇÃO DA JORNADA
Contudo, a partir dos anos de
1980, com a expansão do desemprego e a implantação gradativa de formas de
trabalho mais precárias, estes avanços desaceleraram. Verificaram-se até mesmo riscos
de retrocessos, como apontaram as fortes pressões das representações
empresariais e de vários governos europeus (como a Alemanha, a Inglaterra, a
França e a Espanha), que buscaram criar mecanismos para aumentar a jornada
semanal de trabalho e reduzir o custo da hora extra. A alegação era de que
estas conquistas representariam “inflexibilidades” do mercado de trabalho
desses países, que acabavam por reduzir a competitividade dos produtos
europeus.
Esta busca da flexibilização
aconteceu justamente em um momento em que o mercado europeu, como de resto de
todo o mundo, sofreu com a competição dos produtos de novos países emergentes,
como a China, que se caracterizam por elevadas escalas de produção e baixos
custos de trabalho.
OS EFEITOS DAS HORAS EXTRAS SOBRE A SAÚDE DOS TRABALHADORES
Há consenso entre os
especialistas da área da saúde do trabalho quanto aos efeitos danosos de
jornadas longas e das horas extras sobre a saúde e o bem-estar físico e
psíquico dos trabalhadores. Diversos estudos no Brasil e no exterior já
correlacionaram jornadas de trabalho excessivas e cansaço, estresse, problemas
cardíacos, dores musculares e ósseas, infecções crônicas, entre outras
enfermidades e lesões.
Apenas a título de ilustração, tome-se
o estudo da Escola de Medicina da Universidade de Massachusetts, com base no
acompanhamento de cerca de 110 mil empregos nos EUA (...). De acordo com este
estudo, os empregados que realizam muitas horas extras possuem, em função do
estresse e da fadiga, 61% mais probabilidade de sofrer lesões ou adquirirem
doenças associadas com o trabalho do que aqueles que não realizam jornadas
longas. Dos 110.236 empregos analisados, verificou-se um total de 5.139 lesões
ou enfermidades. Mais de 50% desse total de incidência decorreram de jornadas
longas de trabalho ou de horas extras.
É também conhecido que, a partir de
determinado ponto do processo de trabalho, existe uma relação inversamente
proporcional entre jornadas longas e produtividade/qualidade.
No caso brasileiro, as horas
extras constituem-se também em fator de motivação de uma grande quantidade de
processos trabalhistas. Os autores deste artigo desconhecem quantificações do
volume de recursos envolvidos nestes processos trabalhistas. Caso efetivamente
não existam, registre-se nossa sugestão para que as Centrais Sindicais realizem
um diálogo com o Judiciário, com o objetivo de construir indicadores.
Em termos macroeconômicos,
jornadas longas e horas extras em níveis abusivos resultam em impactos
negativos que agravam o quadro de desemprego em todo o mundo. Estimativas da
OIT, OCDE, ONU e outras instituições internacionais apontam para um total de
mais de 180 milhões de desempregados no mundo.
A FLEXIBILIDADE DO TEMPO DE TRABALHO NO BRASIL
A implementação de um conjunto de
ações sindicais, visando a efetiva redução da jornada normal e do excesso de
horas extras é prioridade ainda mais urgente em um país como o Brasil, no qual
o tempo dedicado ao trabalho vai além da já alta jornada legal máxima de 44 h
semanais, permitida atualmente pela Constituição Federal. Tome-se o caso do
tempo de trabalho utiliza para o transporte da residência ao trabalho (horas in itinere). Em nosso país, quando se
computa este tempo de transporte, a jornada pode ser acrescida em dezenas de
horas a mais.
Se, por exemplo, um trabalhador
necessita entre uma hora e meia e duas no deslocamento de sua casa até o local
de trabalho, e o mesmo tempo para voltar para a sua casa, ele tem semanalmente
uma jornada adicional, para além do permitido pela Constituição, de 15 a 20
horas. Neste exemplo, a jornada semanal pode chegar a 64 horas semanais. Isto,
mesmo que o trabalhador não faça nem uma hora extra na semana.
Em que pese o detalhamento da
Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) no que se refere ao tema da jornada de
trabalho, é grande a flexibilidade das empresas para poderem dispor do tempo de
trabalho dos trabalhadores. A começar pelo fato de que, como dito, a jornada
normal de trabalho de 44 h semanais já é em si mesma bastante elevada. Esta
extensa jornada legal deriva, em grande medida, do fato de que o país ficou
período demasiadamente longo (de 1934 a 1988) estacionado na jornada legal
máxima de 48 h semanais.
É verdade que algumas categorias
já haviam conquistada a redução dessa jornada máxima. Em 1985, algumas
categorias, especialmente do setor industrial, realizaram intensa mobilização
(que envolveu diversas greves) para a redução da jornada de trabalho,
resultando em acordos coletivos que reduziram a jornada para 45 horas, e em
alguns casos até mesmo as 40h semanais. Esta mobilização histórica foi um dos
fatores decisivos para a posterior decisão da Constituinte em reduzir a jornada
constitucional para as 44h semanais (...).
A redução constitucional da
jornada máxima para patamar inferior a 44 h semanais fixada em 1988 continua
como uma bandeira do movimento sindical brasileiro, embora, uma vez mais,
categorias já tenham alcançado jornadas inferiores a este nível. A meta é a
jornada constitucional máxima de 40h semanais.
Entretanto, o manejo do tempo de
trabalho pelos empregadores no Brasil é ainda mais elástico, tendo em vista que
os empresários podem se valer, também, das horas extras e do mecanismo do banco
de horas. No caso deste último instrumento, cabe dizer que, introduzido em lei
pelo Governo de Fernando Henrique Cardoso, em 1988, ele é bem diferente dos
acordos também chamados de banco de horas realizados por algumas categorias
(...).
OS ACORDOS DE FLEXIBILIZAÇÃO E REDUÇÃO DA JORNADA REALIZADOS PELO
SINDICATO DOS METALÚRGICOS DO ABC
Os acordos desta categoria são
anteriores à própria lei do Governo FHC e envolvem a contrapartida da redução
da jornada semanal média, a manutenção do nível de remuneração e emprego e o
compromisso de novos investimentos na empresa. Por exemplo, no final de 1995,
foi firmado acordo entre o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e a multinacional
Ford, no qual se estabeleceu uma flexibilidade do tempo de trabalho, com a
jornada variando entre 36h e 44 h semanais. Em contrapartida, a jornada média
caiu de 44 h para 42h semanais. Acordo semelhante foi estabelecido com a
Volkswagen em 1996, pela primeira vez com a constituição de um “banco de
horas”, para regular créditos e débitos das horas trabalhadas em relação à nova
jornada média.
Cabe mencionar também outras
medidas relativas ao tempo de trabalho que, no final dos anos de 1990,
contribuíram para uma flexibilização no sentido da precarização do mercado de
trabalho brasileiro. São os casos do contrato por jornada parcial (1998) e da
liberalização do trabalho aos domingos, sem a necessária negociação coletiva
(2000).
AS HORAS EXTRAS E OS CÁLCULOS DO VOLUME E CUSTO DECORRENTES DA
APLICAÇÃO DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
A legislação das horas extras é
também bastante flexível. A CLT, em seu artigo 59, permite nada menos que 2
horas extras por dia, desde que pago um adicional obrigatório de pelo menos 50%
superior à hora normal, como consta na Constituição Federal (art. 7, XVI).
A partir de uma leitura ao “pé da
letra”, elaboramos os cálculos que se seguem, que estimam o potencial de horas
extras e de jornadas anuais “permitidos” pela CLT.
O volume potencial implicitamente
“permitido” pela legislação brasileira é de 552 h extras por ano (sem
considerar as horas extras realizadas nos feriados e domingos).
Suponhamos um trabalhador que
trabalha sob o regime da jornada de 44h semanais e faz 2 horas extras por dia
todos os dias. Este trabalhador tem uma
jornada potencial de 2.568 h de trabalho (2.016,67 h normais mais 552 horas
extras potenciais). Se sua jornada semanal contratada é de 42 horas, ele tem
uma jornada anual potencial de 2.477 h. No caso de sua jornada contratada ser
de 40h, a jornada potencial é de 2.385,33h.
Por sua vez, o adicional
obrigatório de pelo menos 50% sobre as horas extras não é suficiente para
impedir a sua realização. Os custos do trabalho no Brasil são baixos, tanto nas
pequenas, médias e grandes empresas. Isto faz com que, mesmo depois de
aplicados o adicional mínimo de 50% (ou percentuais superiores negociados em
acordos coletivos, como 75%, por exemplo), os custos do trabalho continuem
pequenos.
De acordo com cálculos da
Subseção DIEESE da CUT Nacional, realizados em 2006, o custo – quando o
adicional sobre a hora extra é de 50% - é de aproximadamente 0,96% da receita
líquida nas pequenas empresas, de 0,63%, nas médias e 0,55%, nas grandes. Se o
adicional é de 75% sobre a hora normal, o custo passa a ser de 1,12% da receita
líquida nas pequenas, 0,73% nas médias e 0,64% nas grandes empresas.
O custo anual estimado com o
pagamento de horas extras no Brasil é de pelo menos R$ 6,1 bilhões
(considerando-se que todas as empresas paguem um adicional de 50%), ou 0,63% do
faturamento líquido. Um aumento do adicional para 75% sobre o valor da hora
normal representaria um custo adicional da ordem de R$ 1 bilhão.
A BAIXA EFICÁCIA DA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA PARA COIBIR AS HORAS EXTRAS
Posto estes cálculos, voltemos à
questão da baixa eficácia da legislação atual. Acrescente-se que há também
muitos casos em que as horas extras não são computadas, em claro desrespeito ou
anuência do trabalhador, já que este está permanentemente pressionado pela
necessidade da manutenção do emprego. A isto se soma o baixo, quando não
inexistente, poder de pressão da maioria dos sindicatos brasileiros para fazer
com que as empresas cumpram a lei.
Um elemento cada vez de maior
peso entre os fatores explicativos da baixa eficácia da legislação trabalhista
brasileira é que as jornadas longas e as horas extras não pagas estão
intimamente associadas com a crescente precarização e informalização do mercado
de trabalho brasileiro. Em nosso país, dos 49,1 milhões de assalariados em
2003, um total de 18,6 milhões de pessoas (37,8%) não tinha carteira de
trabalho. Logo, um grupo enorme de
trabalhadores está desprovido de qualquer direito dos previstos na legislação.
Em regiões como Centro-Oeste, Norte e Nordeste, 40,5%, 49,1% e 51,8% dos
assalariados não têm carteira. Além disso, a expansão dos terceiros e das
formas de contratação precárias (como o trabalho temporário e os estagiários),
que se caracterizam pelos salários mais baixos e jornadas mais longas,
contribuem para deteriorar ainda mais o próprio perfil dos assalariados com
carteira de trabalho.
O quadro de desemprego e de
precarização do mercado de trabalho gera também uma outra dimensão em relação
ao fenômeno das horas extras: a de que o trabalhador, em determinados momentos,
realiza as horas extras, não como parte de um acordo prévio com seu empregador
(como prevê a legislação), em um ato de livre manifestação de vontade das
partes, mas por temer a perda do emprego como represália da empresa a uma
eventual negativa do empregado.
Já na visão das empresas, as
horas extras, além do baixo custo já mencionado, permitem - em um contexto de
incertezas, oscilação e instabilidade da demanda - rápido aumento da produção
quando necessário (isto é, diante de um aquecimento momentâneo do mercado,
encomendas inesperadas ou infortúnios do processo produtivo), sem que isto
obrigue a geração de novos empregos.
Por fim, não se pode deixar de
notar que, não raro, é o próprio trabalhador que demanda a realização de horas
extras, como forma de complementação dos seus baixos rendimentos.
A EVOLUÇÃO DAS HORAS EXTRAS
Apesar do fenômeno das horas
extras ser uma constante da realidade brasileira desde os primórdios do
trabalho assalariado no Brasil, não há ainda uma pesquisa nacional periódica
que, detalhadamente, meça o volume das horas extras, suas causas, consequências,
volume por setor etc. Todavia, mesmo com os dados existentes, é possível
afirmar que este é um problema que deve ser urgentemente encarado por parte da
sociedade brasileira.
Se as horas extras não forem
controladas, corre-se o risco de, em caso de alcançada a meta da redução
constitucional da jornada de 44 horas para 40 horas semanais, o nível de
emprego não se ampliar significativamente. Esta suspeita fundamenta-se no
passado recente do mercado de trabalho brasileiro. Logo após a redução da
jornada de trabalho na Constituição de 1988, de 48 para 44 horas semanais,
observou-se um forte crescimento do percentual de trabalhadores que praticavam
horas extraordinárias.
Entre 1985 e 1988, a média de
assalariados (da indústria, comércio e serviços) na Grande São Paulo que
trabalhou além da jornada legal ficou entre 26% e 27%. Contudo, logo no ano de
1989, após entrar em vigor a nova Constituição, o percentual dos que
trabalharam acima da jornada legal subiu para 42,6%, e manteve uma tendência
crescente desde então. No ano de 2004, um total de 45,6% trabalhou acima da
jornada legal. Em outras palavras, pelo menos 4 em cada 10 trabalhadores faziam
horas extras acima da jornada legal.
Constata-se ainda que, quando se
analisa por setor de atividade, a indústria e os serviços acompanharam de perto
a média geral dos assalariados. Na indústria, o percentual dos que trabalham
acima da jornada legal subiu de 21,4% em 1988 para 42,0% em 1989 e 44,2% em
2004. Nos serviços, de 25,5% em 1988 para 36,7% em 1989 e 40,9% em 2004. Já o
comércio se destaca pelo fato de que a grande maioria dos empregados tem
trabalhado nos últimos anos acima da jornada legal. Este contingente de
trabalhadores sobe de 43,1% em 1988 para 57,5% em 1989 e 63,1% em 2004.
Assim, no ano de 2004, na Região
Metropolitana de São Paulo, enquanto a jornada média da indústria foi de 43,8
horas semanais e nos serviços, 42,8 horas, a jornada média no comércio foi de
nada menos que 48,2 horas. Em outras palavras, a jornada média efetiva neste
segmento é inclusive superior à jornada de 48 horas, que legalmente deixou de
vigorar no Brasil a partir da Constituição de 1988.
As horas extras representaram,
assim, no período, um recurso das empresas para compensar a redução da jornada
para 44 horas semanais, contornando em boa medida a necessidade de novas contratações.
Ademais, elas têm sido largamente utilizadas em momentos de retomada da
atividade econômica, o que acaba reduzindo os impactos positivos do crescimento
na geração de novos postos de trabalho.
POR UMA NOVA ESTRATÉGIA SINDICAL E UMA NOVA LEGISLAÇÃO
A consequência prática de tudo o
que foi exposto é que a estratégia do movimento sindical frente à questão das
horas extras, no Brasil, necessita ganhar um novo enfoque. A meta de longo
prazo, do nosso ponto de vista, deve permanecer a mesma, isto é, a luta pelo
fim das horas extras, que é uma bandeira histórica do sindicalismo. No entanto,
a estratégia para se atingir este objetivo em nosso país exige um ajuste no
discurso e na ação do movimento sindical.
Primeiramente, é preciso que a
luta do sindicalismo brasileiro pela redução da jornada constitucional de
trabalho sem redução de salários esteja permanentemente associada, com o devido
destaque, ao tema da eliminação do abuso no uso das horas extras. A tão
almejada conquista das 40 horas semanais (em uma primeira fase, seguida das 36
horas semanais, em uma segunda fase), que é a meta da campanha unificada das
Centrais Sindicais, somente resultará em efeitos positivos, em termos de saúde
dos trabalhadores, lazer e geração de postos de trabalho, se o atual arcabouço
que regula as horas extras no Brasil for simultaneamente modificado.
Vimos que, isoladamente, o mero
aumento do adicional, nos acordos e convenções coletivas, não garante que as
horas extras serão efetivamente controladas, muito embora, dependendo da
especificidade das condições de trabalho em cada categoria, isto possa ocorrer.
Para que se alcance o “fim” das
horas extras - bandeira histórica do movimento sindical – é fundamental a
elaboração de uma estratégia que envolva etapas. Assim, entre essas estariam:
a) a realização de pesquisas
periódicas (por exemplo, mensal, trimestral ou semestral), em nível nacional,
regional e setorial, que mensurem com maior rigor e detalhes o fenômeno das
horas extras no Brasil. O desenvolvimento da Pesquisa de Emprego e Desemprego
do DIEESE – SEADE, no que se refere ao tema da jornada, é uma dessas
possibilidades.
b) a partir de uma articulação
construída por meio da Central Sindical, estabelecer a prioridade do tema nas
campanhas salariais das diversas categorias, de forma que, orientadas a
seguirem uma cláusula-referência, as categorias possam pressionar por acordos
na mesma direção, ainda que com as devidas adaptações em cada caso. Esta ênfase
simultânea no tema ajudaria a dar maior visibilidade e poder de pressão;
c) Com base nas propostas já
apresentadas pelas diversas instâncias da sociedade brasileira em relação ao
controle das horas extras, debater com órgãos e entidades como o Ministério do
Trabalho, Ministério Público, TST, ANAMATRA e OAB, entre outras, a construção,
na medida do possível, de um projeto comum a ser encaminhado ao Congresso
Nacional;
d) Este diálogo deveria envolver
também entidades empresariais, como a CNI, CNA, CNF, CNS, CNC, CNT e FIESP,
entre outras;
e) A construção de uma proposta
que tenha um significativo grau de adesão entre os atores sociais deve então
ser sucedida do seu encaminhamento ao Congresso Nacional na forma de projeto de
lei. Este projeto deve estabelecer mecanismos que efetivamente limitem as horas
extras no Brasil. Entre os parâmetros que podem constar do projeto:
·
a limitação quantitativa das horas extras
máximas que se pode fazer no país em determinado período de tempo (por dia,
mês, semestre, ano);
·
o estabelecimento de regras para os casos em que
é compulsória a contratação;
·
a revogação dos artigos de lei que permitem a
realização de horas extras aos domingos aos empregados no comércio (art.6º da
Lei 10.101, de dez. 2000) e do banco de horas;
·
a obrigatoriedade da negociação das horas extras
realizadas nos domingos, feriados e dias já compensados, além do incremento do
adicional;
·
a proibição das horas extras para
determinados tipos de empregados, como mulheres lactantes e aposentados;
·
a criação de parâmetros eficazes de controle por
parte do movimento sindical e dos órgãos públicos.
É claro que este projeto de
legislação, além de ser factível diante da correlação de forças, deve ser
acompanhado de amplo debate e esclarecimento dos trabalhadores, ao lado de uma
necessária política de recuperação gradativa dos salários no país.
Jefferson José da Conceição é Prof. Dr. da USCS e Atual Diretor Técnico
da Adesampa. Foi Secretário de Desenvolvimento Econômico, Trabalho e Turismo de
São Bernardo do Campo entre janeiro de 2009 e julho de 2015. Foi
Diretor-Superintendente do SBCPrev entre ago.2015 e fev.2016. Foi economista do
Dieese, no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (entre 1987 e 2004) e da CUT
Nacional (entre 2004 e 2009).
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